terça-feira, 15 de agosto de 2017

O Tiro Que Não Saiu Pela Culatra

Assim como “O Casal Osterman”, de Sam Peckinpah, e “A Tocha de Zen”, de King Hu, este "Parenthood" é um daqueles casos de títulos nacionais equivocados que não dão a menor idéia do que será de fato a produção em si. Pior: Seu título sugere uma comédia rasgada e pastelão –impressão potencializada pela presença de Steve Martin –que o filme, no fim das contas, não é. O quê deve ter frustrado muitos expectadores mal informados que lhe foram conferir.
O trabalho do diretor Ron Howard (ainda nos anos 1980, antes da consagração com “Apollo 13” e “Uma Mente Brilhante”), contudo, é cheio de sutileza e inteligência, daquelas raras comédias agridoces que apelam à maturidade do público.
A começar pela estrutura do roteiro que compartilha a trama entre diversos personagens, todos membros de uma mesma família, os Buckman.
O protagonista, Gil (Steve Martin, admiravelmente contido), guarda um leve ressentimento da educação algo rude recebida de seu pai (o sensacional Jason Robards), e almeja uma proximidade de seus três filhos pequenos muito maior do que a que ele teve. Tudo, entretanto, atrapalha. Sejam as exigências profissionais, sejam as próprias crianças e seus eventuais problemas escolares e de adequação, o que leva Gil e sua esposa Karen (a cativante Mary Steenburgen) a questionar seus desempenhos como pais.
Do lado da irmã de Gil, Helen (Dianne Wiest, ótima) as coisas não estão muito mais simples: Divorciada, ela se vê perplexa –e, na maioria das vezes, sem saber o quê fazer –com o comportamento do filho pré-adolescente Garry (Joaquim Phoenix, ainda bem jovem, aqui assinando ainda como Leaf Phoenix) e as atitudes rebeldes da filha Julie (Martha Plimpton) que cismou de se envolver com um rapaz desajustado, Tod (Keanu Reeves, na fase “Bill & Ted”).
Já a irmã mais jovem, Susan (a bela Harley Kozak) tem um casamento cada vez mais asséptico com o metódico Nathan (Rick Moranis, apático), uma vez que ele se dedica menos ao relacionamento com a esposa e mais à educação pouco usual da filha pequena dos dois.
O próprio patriarca interpretado por Jason Robards tem lá seus problemas: O caçula Larry (Tom Hulce, de “Amadeus”) retornou para o seio da família e trouxe a tira-colo um filho pequeno que todos desconheciam –e que logo sobra para os avôs cuidarem –assim como diversas dívidas irresponsáveis obtidas em jogatina.
É um panorama feito com carinho das famílias norte-americanas, sempre às voltas com circunstâncias que caminham em direção à disfunção, nesse sentido, ele lembra uma pouco a obra-prima chinesa “As Coisas Simples da Vida”, de Edward Yang.

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