Numa das ironias existentes na prosa literária
de Michael Ondaatje em seu aclamado livro, o ‘paciente inglês’ do título acaba
sendo húngaro (!), mas ao verter o quê seria a espinha dorsal da narrativa
–tida por inadaptável –para o cinema, o diretor Anthony Minghella priorizou
menos os aspectos de desafiador atrevimento estrutural e mais o elemento que,
em seu cinema, sempre ganhou destaque primordial, o amor.
É, portanto, um romance que ele extrai daquele
livro melindroso, cheio de teorias e de possibilidades, se circunstâncias
imaginadas e não concretizadas e de uma lógica mais abstrata do que cartesiana.
É o fim da Segunda Guerra Mundial. Um paciente
não identificado e completamente desfigurado por queimaduras aparece num
hospital militar próximo da Itália. Uma enfermeira canadense (Juliette Binoche,
maravilhosa) se compadece dele e decide abandonar seu comboio para cuidar dele
até seus últimos dias de vida num mosteiro da Toscana.
Aos dois juntam-se, mais tarde, uma dupla de
soldados especializados em desativar minas terrestres (Kevin Whately e Naveen
Andrews, que depois participou da série “Lost”) e um fugitivo misterioso
(Willem Dafoe).
Paralelamente, a trágica história do assim
chamado paciente inglês vai se desenhando na tela, e ficamos sabendo que ele
foi um conde húngaro chamado Lazlo Almasy (Ralph Fiennes, um herói romântico
brilhantemente distante da sisudez do oficial nazista de “A Lista de
Schindler”). Em suas viagens de natureza cultural e intelectual por regiões do
Marrocos, Lazlo se vê na companhia de um grupo obsequioso de aristocratas,
entre eles, Katharine (Kristin Scott Thomas, uma escolha inesperada
revelando-se linda, vulnerável e cativante), esposa de um milionário britânico
(Colin Firth). Lazlo se apaixona por Katharine, e esse caso de amor acaba tendo
oportunidade de se concretizar durante uma solitária empreitada a dois pelo
deserto. Será o desejo cada vez mais irreprimível dos amantes em ficarem juntos
e as gradativas constatações do marido de Katharine acerca do adultério que
levarão ao desenlace trágico que conduzirá Lazlo quase a morte e àquele leito
na Toscana.
Produzido de forma independente pelo veterano
Saul Zaentz (que tem em seu currículo “Um Estranho No Ninho”, “Amadeus” e “AInsustentável Leveza do Ser”, além da animação maldita de Ralph Baski para “O
Senhor dos Anéis”), a realização do diretor Minghella busca referências
essenciais em obras de altíssimo nível cinematográfico, principalmente os
épicos de David Lean como “Lawrence da Arábia” e os de Bernardo Bertolucci, em
especial “O Céu Que Nos Protege”. Essa poderosa herança visual é colocada a
serviço de uma história isenta da linearidade, narrada através de lembranças e
flashbacks que embaralham os fatos e dão um novo viés a eventos cuja percepção
seria diferente se contados em ordem cronológica.
O resultado disso tudo terminou
agraciado com nove Oscars na cerimônia de 1997.
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