Já tendo um Oscar debaixo do braço (por
“Forrest Gump”) e feito, anos depois, pelo menos dois filmes bastante
superiores ao seu consagrado trabalho (“Contato” e “Náufrago”), o diretor
Robert Zemeckis parecia não ter mais nada a provar nem a si mesmo, nem a
ninguém mais; deixou então que sua carreira entrasse numa espécie de ‘fase
experimental’ onde explorou –por meio de alguns longas animados de qualidade
claudicante –os limites da computação gráfica em substituição à encenação
humana.
O primeiro –e talvez até hoje, melhor –filme
dessa fase foi o natalino “Expresso Polar”, no qual Zemeckis contava com Tom
Hanks, dublando e personificando pelos quatro dos personagens do filme, incluindo
o cobrador do trem (que, de fato, tem suas feições recriadas), o fantasma
descrente e o Papai Noel.
O livro de Chris Van Allsburg no qual se
baseia, realmente era de uma linguagem cuja transição para cinema não seria
satisfatória com uma filmagem em termos e condições normais: Zemeckis empregou
uma técnica de captura de performance ainda sem arestas aparadas (ainda era a
época do lançamento em cinemas de “O Senhor dos Anéis” que trazia o personagem
Gollum, uma ressonante inovação nessa área) para materializar na tela as
ilustrações da maneira fiel ao tom de gravura que o livro trazia.
É noite da Véspera do Natal quando um garotinho
defronta-se com sua própria incredulidade e anseia por uma prova de que o Papai
Noel realmente existe. Como ele pode morar no pólo norte (que os livros de
ciência afirmam ser inabitável)? Como pode voar num trenó puxado por renas?
Perturbado por essas dúvidas, ele assiste, com
desconfiança, a execução dos rituais natalinos domésticos (a meia na lareira, o
leite com os biscoitos deixados para o bom velhinho) e vai dormir. Entretanto,
durante a noite para sua surpresa, um imenso trem expresso para em frente a sua
casa (onde antes sequer havia trilhos!). E o cobrador o recebe com a promessa de
levá-lo, junto de outras crianças, ao pólo norte, suposto lar do famoso
velhinho. Ele embarca trajado em seus pijamas, como também estão trajadas de
pijamas as inúmeras outras crianças que ocupam o vagão. No curso dessa viagem,
ele faz amizades, enfrenta perigos e ainda conhece um fantasma, uma espécie de
personificação de todas as suas dúvidas.
No entrecho final, como prometido, o Expresso
Polar os levará à morada do Papai Noel, habitada por elfos pequeninos e
irrequietos que nunca param de trabalhar, e o garotinho irá encontrar um
equilíbrio otimista e tocante entre suas certezas e suas crenças.
Ao valer-se da inovadora técnica da captura de
performance –que, nota-se, ainda seria muito aprimorada até funcionar a
contento –Robert Zemeckis realiza uma série de seqüências que seriam
humanamente impossíveis de serem encenadas, com direitos a números musicais e
movimentos/enquadramentos de câmera inacreditáveis.
Tecnicamente, “O Expresso
Polar” é uma obra datada, até mesmo pela disposição em ser apenas um passo, em
meio a toda uma caminhada, rumo à uma evolução tecnológica constante e
exponencial; seu grande apelo, porém –provavelmente o acerto de Zemeckis neste
trabalho –é sua mensagem humanista de esperança traduzida com bastante
propriedade num filme infantil e enternecedor.
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