Neste filme de conotações extremamente
perturbadoras, Julianne Moore, sempre maravilhosa, entrega uma atuação que
remete a ecos de seus trabalhos inquisitivos em “Longe do Paraíso” e “À Salvo”,
além de também se perceber uma observação similar a de sua personagem em
“Boogie Nights” onde os erros cometidos parecem ser incapazes de fazer uma
personalidade irredutível compreender aonde errou.
“Pecados Inocentes”, dirigido por Tom Kalin com
um distanciamento antropológico que chega a lembrar vagamente Martin Scorsese
em “A Época da Inocência”, se incumbe de relatar um chocante caso real ocorrido
em meados de 1969.
Antes disso, ele sedimenta a estranha e
obcecada relação de dependência psicológica formada entre a socialite Barbara
Baekeland (Julianne) e seu único filho, Tony.
O casamento entre Barbara e o marido Brooks
(Stephen Dillane, de “As Horas”) era um amálgama de ressentimentos, tédio e
provocações constantes.
Intempestiva e ocasionalmente atrevida,
Barbara não se encaixava na burguesia francesa da Paris dos anos 1950 onde
durante um bom tempo eles moraram. O nascimento do filho, Tony, preencheu a
lacuna deixada pelas amizades fracassadas e pela frustrante vida social; no
entanto, por conta disso, Barbara criou com o filho, desde tenra idade, uma
relação simbiótica que tornou-se doentia a medida que ele foi crescendo –e que,
no filme, na maior parte das vezes ganha um registro até ameno e elíptico.
Quando Tony já tem dezoito anos (e é, pois,
interpretado por Eddie Redmayne) e suas tendências homossexuais começam a ficar
mais evidentes, os acontecimentos diretamente relacionados à tragédia começam a
se suceder: Entre outros jovens amantes, ele arruma uma namoradinha de verão,
Blanca (vivida pela espanhola Elena Anaya) que, um ano depois, torna-se amante
de seu pai (!) e pivô da separação definitiva dele e de sua mãe.
A indignação com tal situação leva Barbara a
buscar alento primeiro nos braços de Sam (Hugh Dancy, de “Histeria”, “Martha, Marcy, May, Marlene” e “Falcão Negro Em Perigo”) que torna-se amante de Tony
também (!!), e depois, a mudar-se para Londres a fim de dar vazão ao seu lado
artístico.
Nesse ponto, porém, Barbara e Tony já partilham
de uma natureza sexual tão insólita que sua relação não tarda a galgar para o
incesto (!) e então para uma psicopatia latente que o rapaz ainda não havia
conseguido extravasar.
Realizado com um distanciamento emocional que
torna o filme por vezes indigesto, o trabalho do diretor Kalin flutua com
pretensa elegância pelos momentos incômodos (que se intensificam
consideravelmente na meia hora final) ostentando uma atenção nem sempre
apropriada ao elaborado detalhamento cênico. E sua abordagem do incesto entre
mãe e filho não surge displicente, como em “La Luna”, nem nostálgica, como em
“O Sopro do Coração”, mas imbuída de um distúrbio torpe e corrosivo.
Se Eddie Redmayne entrega uma interpretação
carente de maiores retoques, a produção teve a sorte de contar com Julianne
Moore, aquele tipo de atriz que consegue tirar leite de pedra: Ela trabalha
magnificamente as facetas dessa personagem complexa e ingrata, sabendo enfatizar
os aspectos mais apetecíveis aos olhos do público em cada etapa para que o teor
trágico da premissa não se torne de pronto insuportável: Na primeira parte, ela
é inesperadamente sensual; na segunda, sua perplexidade ganha até um pouco de
simpatia (podendo até enganar expectadores desavisados com o filme); e na
terceira e última, sua composição evidencia os esforços vazios, quase à beira
da insensatez, de Barbara em manter sólida uma estrutura familiar que se
espatifa em pedaços.
É aquele caso em que a
atriz está anos-luz a frente do filme que protagoniza.
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