O found footage é um estilo que já está aí a
algum tempo se considerarmos que as obras inaugurais de sua técnica sejam os
clássicos obscuros “A Tortura do Medo”, de 1960, e “Holocausto Canibal”, de
1980, embora tenha sido com “A Bruxa de Blair”, de 1999, que ele tenha surgido
com as características que de fato foram assimiladas pela indústria.
O advento das ferramentas digitais e das mídias
sociais trouxe novas formas de se empregar o conceito do found footage, e
alguns poucos filmes de terror e suspense tentaram criar narrativas a partir
daí, como é o caso do consideravelmente surpreendente “Perseguição Virtual”, de
Nacho Vigalondo, e deste “Amizade Desfeita”.
Dirigido pelo jovem Leo Gabriadze e produzido
por Timur Bekmambetov, o filme tem o princípio básico e subjetivo do found
footage: Tudo o que vemos é tão somente de um único ponto de vista, a tela do
computador da personagem principal.
Tal personagem é Blaire Lilly, interpretada por
Shelley Hennig –e é interessante notar que os exemplares contemporâneos do
found footage contornaram (ou tiveram de contornar) a tentativa de enganar o público se passando por pura
realidade, apelo intrigante que representou muito do atrativo comercial de “A
Bruxa de Blair” e até mesmo de “Holocausto Canibal”.
Neste novo filme –de 2014 –a questão de ser ou
não ficção é deixada de lado; até porque, com a internet, qualquer pessoa descobre
a veracidade sobre um filme com um clique. Em vez disso, os realizadores se
contentam em usar do formato tão somente como um meio para intensificar ainda
mais o desespero e a aflição de seus personagens.
“Amizade Desfeita” começa mostrando um video do
youtube onde uma jovem tira a própria vida. Logo, estamos então testemunhando a
intimidade de Blaire –que descobrimos ter sido grande amiga de Laura Barns
(Heather Sossaman), a garota que se suicidou –ao lado do namorado Mitch (Moses
Storm). Entretanto, a sala de bate-papo dos dois –que progredia para joguinhos
sensuais –logo é invadida por seus amigos, a patricinha Jess (Renee Olstead), o
descolado Adam (William Peltz), o hacker Ken (Jacob Wysocki) e a intransigente
Val (Courtney Halverson).
É o dia em que completa um ano do suicídio de
Laura, e esses colegas, em princípio alheios ao fato, se incomodam quando
alguém não identificado –apenas com o codinome ‘Billie 227’ –entra em sua sala
de bate-papo. Aqui e ali, pequenas coisas vão acontecendo –o que demonstra o
inteligente apego aos detalhes da direção e do roteiro –onde podemos perceber a
evolução da narrativa, indo do trivial para o aflitivo: Eles descobrem que
‘Billie” é uma conta inativa de Laura Barns e, inicialmente, julgando que ela
foi hackeada, tentam denunciar quem quer que seja à polícia.
‘Billie’ –ou, quem sabe, o fantasma de Laura!
–não permite: Aparentemente, ela tem um controle sobre as ferramentas digitais
ainda maior que o conhecimento técnico de Ken que, a propósito, é uma de suas
primeiras vítimas; sim, pois, tal entidade (se é que dá para chamá-la assim)
parece ser capaz de despertar instintos suicidas.
Entretanto, há mais por trás disso, e ‘Billie’
manifestou-se via internet para todos aqueles jovens porque deseja revelar os
segredos vulgares e as mentiras detestáveis uns para os outros antes da noite
se acabar, dando-lhes assim o devido castigo –e assim o filme de Leo Gabriadze
lança mão de artifícios sobrenaturais para construir sua estrutura de terror
pós-moderno. Há certamente nisso também uma referência ao terror japonês que
aflorou, com sucesso de público, inclusive, nos anos 1990, onde as tecnologias
que surgiram ao alcance das pessoas eram quase sempre empregadas como
invólucros de entidades malignas e perturbadoras em obras como “Kairo”, “O Chamado” e tantas outras.
Deliberadamente, “Amizade
Desfeita” se despe da sutileza e da salutar carga alegórica que elevava alguns
títulos daquela vertente de cinema a um patamar maior –em sua tensão escapista,
sua trama de intriga adolescente e seu moralismo volúvel e banal em torno do
bullying virtual, o filme de Gabriadze não quer ser mais que um filme
apavorante e divertido. Objetivo que em um ou dois momentos de sua meia hora
final ele quase chega a atingir.
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