Realizado nos anos 1990, o canadense “Cubo”, do diretor
Vincenzo Natali, é uma experiência poderosa na forma árida com que se apresenta
ao expectador.
São cinco personagens, diferentes entre si,
suas memórias apagadas, o quê torna o fato de acordarem num lugar desconhecido
um mistério tanto para eles quanto para o expectador.
O lugar em questão é uma sala de dimensões e
ângulos exatamente idênticos: Um cubo.
Suas quatro paredes têm janelas centrais e elas
conduzem à outros cubos. Subentende-se que em algum momento, eles deverão achar
a saída.
Mas, aí vem a jogada: Algumas salas guardam
armadilhas mortais, outras, não.
Cabe a esses desconhecidos, como um grupo, unir
suas diferentes aptidões para conseguirem escapar desse lugar com vida.
Contudo, mais do que as armadilhas –algumas elaboradas com perversidade
mirabolante –o grande perigo reside na incapacidade de compatibilidade entre
alguns deles.
Há, por exemplo, o demasiado focado e
compenetrado Quentin (Maurice Dean Wint), um policial –ao menos, assim ele se
identifica –desesperado por escapar com vida do cubo e rever os filhos; o
inicialmente arrogante e cético Worth (David Hewlett, de “A Forma da Água”) que
não se importar com a própria vida nem com a dos companheiros: a médica
Holloway (Nicky Guadagni, de “Crash-Estranhos Prazeres”); a jovem estudante de
matemática Leaven (Nicole DeBoer); e o ex-presidiário especialista em fugas Renn
(Wayne Robson).
Um grupo heterogêneo que, em princípio,
funciona de forma claudicante em equipe –Worth é apático, Quentin, violento, e
Leaven, perplexa –no entanto, detalhes começam a chamar a atenção quando o
desespero começa a se afunilar: Como a razão pela qual os pertences de todos
foram removidos, exceto os óculos de Leaven.
Parece haver um propósito naquela reunião de
tipos distintos que reside numa especialidade de cada um deles –inclusive na de
Kazan (Andrew Miller, de “Super 8”), um deficiente mental que, mais tarde, se
junta ao grupo –embora, nos rumos tomados pelo roteiro, esse objetivo fique
deliberadamente sem respaldo ou explicação.
Falha da produção ou intenção da narrativa?
Difícil dizer.
O que se percebe, é que Leaven consegue
decifrar, até certo ponto, as numerações que aparecem em cada entrada para uma
nova sala. E essas numerações não só indicam se o local é seguro ou não, mas
podem apontar também a direção da saída.
Estruturando o suspense com teatralidade
notável, e tirando o máximo de esforço de seu elenco, o diretor Vincenzo Natali
molda um filme admirável na sua restrição ambiental, mas precisamente enxuto na
atmosfera aflitiva que se propõe a envolver o expectador. E nisso, ele faz uso
inteligente não somente dos recursos técnicos disponíveis –do início ao fim,
espartanos –mas, sobretudo, do manejo hábil das dinâmicas entre seus limitados
protagonistas: Quentin é o barril de pólvora prestes a explodir, enquanto que
Holloway, na sua postura abertamente liberal é seu estopim; Worth tem um
interessante arco de mudança ao longo da trama –do desinteresse à empatia
–enquanto Leaven se sai bem em personificar a mocinha pela qual torcemos.
Além de acirrar
constantemente os nervos com mudanças sucintas nessas dinâmicas, o diretor se
basta dentro da fábula claustrofóbica que deseja contar, sem intoxicar seu
filme com pretensões desnecessárias. Esse acerto de tom e de forma logo
converteu “Cubo” num dos mais cultuados exemplares de suspense e ficção
científica do final da década de 1990, fazendo dele uma referência para
inúmeras produções cuja premissa gira em torno de personagens confinados num
lugar mirabolante e ameaçador, influenciando obras até os dias de hoje –como o
blockbuster “Escape Room”, ou o cult espanhol “O Poço” –e gerando uma franquia
que rendeu uma continuação (“Cubo 2-Hipercubo”) e uma prequel (“Cubo Zero”),
todas consideravelmente pálidas diante do ótimo trabalho original.
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