quarta-feira, 15 de setembro de 2021

Roar


 O cinema, volta e meia, testemunha um evento desastroso no qual –como reza a famigerada Lei de Murphy –tudo o que poderia acontecer de errado realmente DÁ errado.

Às catástrofes espetaculares do cinema como “O Portal do Paraíso” e “Waterworld” junta-se este um tanto quanto curioso “Roar”.

A razão para “Roar” ser o filme confuso, inconstante e incoerente que naufragou completamente nas bilheterias em meados de 1981 foi a iniciativa um bocado experimental da parte de seu realizador, o produtor Noel Marshall (que acumulou as funções de produtor, diretor, ator principal e co-roteirista), então colhendo os louros pelo êxito de “O Exorcista”. Casado com a estrela Tippi Hedren (de “Os Pássaros”), Marshall logrou fazer um filme audacioso sobre uma família de naturalistas às voltas com perigosos felinos num esquema quase de filme caseiro: Filmado todo na propriedade da família, protagonizado por sua esposa (Hedren) e coadjuvado pela filha dos dois (uma ainda jovem Melanie Griffith).

A audácia de sua ideia estava no fato de usarem leões e tigres reais para interagir com o elenco: Cerca de cinco anos antes das câmeras começarem a rodar, Marshall e sua família (Tippi Hedren era conhecida como uma ferrenha defensora dos direitos dos animais) passaram a cuidar de uma prole de filhotes de leões e tigres que cresceram junto deles e da equipe técnica, acostumados a terem humanos por perto.

Quando o projeto iniciou as filmagens, porém, uma complicação inesperada se sucedeu na prática: Embora fossem mansos, os leões ficavam confusos quando os atores humanos próximos a eles interpretavam medo toda vez que as câmeras começavam a funcionar; e com isso, os animais ficavam agressivos, atacando quem estivesse por perto e expondo todos os envolvidos do filme a um perigo real.

O resultado foi uma série de acidentes quase fatais envolvendo os bichos ao longo dos meses de filmagem; contabiliza-se setenta membros da equipe e do elenco feridos!

Indefinido em seu gênero (a trama é desenvolvida sem uma noção muito clara ou harmoniosa de suspense, aventura, drama ou filme-família), estourado no seu cronograma (afinal, foram cinco anos!!!) e no seu orçamento (os gastos com emergências médicas e os funcionários constantemente substituindo aqueles que sofreram ataques de animais, o que fez deste o ‘filme mais perigoso de todos os tempos’), e acometido de filmagens absolutamente caóticas, “Roar” chegou aos cinemas concebido de maneira desleixada e abrupta, incapaz de recuperar nas bilheterias todo o investimento a ele dedicado.

O passar dos anos transformou “Roar”, por um tempo, numa produção assídua na “Sessão da Tarde” embora naquela época, o dado intrigante de seus pra lá de turbulentos bastidores não fosse de conhecimento do público –o que tirava assim o sentido da realização rudimentar que se testemunhava –levando a produção de Noel Marshall a cair num esquecimento que, sob muitos aspectos, perdura até hoje. A despeito de tudo isso e da qualidade de fato oscilante de seu resultado final, “Roar” pode ser visto como um testemunho à predisposição humana para encarar desafios por vezes tidos como insanos.

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