sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Viúva Negra


 Com sua história ambientada entre “Capitão América-Guerra Civil” e “Vingadores-Guerra Infinita”, “Viúva Negra” terminou sendo realmente lançado após “Homem-Aranha Longe de Casa”, o que o torna circunstancialmente um filme anacrônico dentro da cronologia do Universo Marvel Cinematográfico –tendo, além disso, sido atrasado em um ano de seu lançamento em cinema por conta da pandemia.

Com essas condições desfavoráveis a lhe pesar, até é admirável que ele seja uma obra tão fluente, agradável e vívida, quando olhamos para além da muralha de críticas rabugentas que ele recebeu.

É um dos mais fracos filmes da Marvel Studios? Nem sob um decreto (esse demérito ainda pertence à “Thor-O Mundo Sombrio” e à “Vingadores-A Era de Ultron”), o seu grande problema é que a Marvel habituou o público a um crescendo notável de qualidade ao longo de seus bem-sucedidos filmes –e essa qualidade intensificou-se nos últimos lançamentos (“Pantera Negra” foi até indicado ao Oscar de Melhor Filme!). Manter esse patamar é, portanto, uma tarefa árdua e, se “Viúva Negra” não o cumpre com totalidade, ao menos, preserva dignidade o bastante para ombrear as excelentes obras mais recentes.

Seu lançamento padece de uma falta absoluta de timing? Com certeza –entre outras coisas, porque a Viúva Negra já deveria ter ganho seu próprio filme muitos anos antes (o produtor Kevin Feige só se convenceu a realizá-lo após forte insistência popular), e porque, diante da consciência do desfecho definitivo que a personagem ganha em “Vingadores-Ultimato”, muito da trama, dos perigos e do suspense no filme acabam perdendo sua razão de ser –afinal, já sabemos de antemão o que acontecerá com a heroína.

Logo após um prólogo que parece sugerir a origem da protagonista em sua infância –mas, que tão somente fornece a origem da dinâmica de ‘família disfuncional’ que une os personagens a rodear a protagonista nesta obra –surgem os créditos iniciais (coisa rara nos filmes da Marvel) ao som de uma versão de “Smell Like Teen Spirit” e, num salto temporal rumo à vida adulta da personagem principal, acompanhamos Natasha Romanoff fugindo das autoridades e das consequências de suas escolhas em “Guerra Civil”.Como a espiã indefectível que é, ela tenta se esconder de tudo e de todos.

Contudo, em seu esconderijo, ela encontra uma encomenda despachada por sua irmã, Yelena Belova (a fabulosa Florence Pugh), garotinha que havia aparecido naquele prólogo.

Como a própria Natasha, Yelena foi capturada para o Programa Sala Vermelha, que formava as Viúvas Negras quando ainda eram crianças, transformando-as em assassinas treinadas a serviço da União Soviética. O destino de Natasha, sabemos, a levou a integrar a S.H.I.E.L.D. e, mais tarde, os Vingadores; já o destino de Yelena, que o filme trata de revelar (de forma até mais abrangente do que os detalhes nebulosos da origem de Natasha), foi tornar-se, também ela, uma Viúva Negra, entretanto, diferente da irmã que teve a sorte de encontrar o Gavião Arqueiro pela frente (levando-a aos EUA e colocando-a num caminho de redenção), Yelena continuou prisioneira da Sala Vermelha e do manipulador líder do programa, o amoral Dreykov (Ray Winstone). É numa missão quase corriqueira que Yelena inala uma dose de gás experimental, um antídoto para o controle bioquímico que ela a as outras Viúvas Negras sofreram, e que as fazem letais para com seus alvos e subservientes para com seu líder.

De posse das poucas cápsulas desse antídoto, Yelena envolve Natasha em sua cruzada para descobrir a misteriosa localização da Sala Vermelha e libertar todas as Viúvas Negras. O que significa reencontrar também o ‘pai’ delas, Alexei, também conhecido como Guardião Vermelho, uma espécie de Capitão América Soviético (vivido com humor nem sempre apropriado por David Harbour), bem como sua ‘mãe’, Melina (Rachel Weisz, sempre elegante e sólida).

Embora se pretenda um filme de espionagem, com todas as suas missões, traições, reviravoltas e agentes duplos, “Viúva Negra” acaba sendo, na realidade, um filme de ação bem mais comum do que se pretende –a notória pouca disposição da Marvel Studios para ousar simplifica o desenvolvimento de sua trama, resultando ela num corre-corre desenfreado no qual as perseguições e sequências de ação surgem bem elaboradas, como era de se esperar. Ainda assim, “Víúva Negra”, na bem urgida cinematografia que emprega não chega a surpreender com sua narrativa (“Capitão América-Soldado Invernal” já fez isso antes), nem tampouco a inovar com o empoderamento de suas protagonistas femininas (a própria Marvel se antecipou a isso com “Capitã Marvel”) –tivesse sido realizado anos antes (quando lançar um filme de Natasha Romanoff ainda seria pertinente) talvez a Marvel Studios colhesse vários louros por sua realização (pois, Scarlet Johansson, realmente, se impõe com primor e circunspecção ao papel), da forma como está, “Viúva Negra” ainda entrete e agrada, mas sofre de algo que os projetos da Marvel Studios foram felizes em evitar: Irrelevância.

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