A continuação do inesperado sucesso “A Quiet Place” foi a primeira produção a sofrer os efeitos da pandemia: “Parte 2” estrearia na mesma semana em que foi decretado o isolamento social, bem como o fechamento de estabelecimentos como cinemas em grande parte do mundo. Algo que atrasou em um ano o acesso do público à ele. É muito curioso que também seu enredo gire em torno de um mundo onde os seres humanos se viram privados de uma vida em comunidade por um inimigo desconhecido.
Embora não deixe de começar, obviamente, no
ponto crucial em que a “Parte 1” acabou, este segundo filme também aproveita –numa
pequena inspiração extraída das lições deixadas em “O Poderoso Chefão-Parte 2”
–para retroceder ao passado, e esboçar com mais minúcia e profundidade as
circunstâncias em que se deu o surgimento dos monstros sem olhos, guiados pela
audição. No prólogo que inicia “Parte 2” nos é mostrado o Dia 1 –e assim,
revemos também o personagem Lee, morto ao final do filme anterior e, à
propósito, interpretado pelo diretor John Krasinski –descobrimos a chegada das
criaturas entre os inicialmente aturdidos seres humanos e, abrupto como muitas
das guinadas da trama, retornamos ao Dia 474, quando as duas crianças, Regan (a
menina surda-muda Millicent Simmonds) e Marcus (o garoto Noah Jupe) junto de
sua mãe (Emily Blunt) descobrem, enfim, a grande fraqueza das implacáveis
criaturas.
Destituídos do pai (que sacrificou-se para
salvá-los) e com um bebê recém-nascido para cuidar, eles arriscam-se a sair do vale
em que estiveram refugiados até então, para cruzarem-se com Emmett, personagem
de Cillian Murphy.
Como todo sobrevivente desse mundo
pós-apocalíptico –e até de outros mais –Emmett vivenciou tantas tragédias que
perdeu completamente a esperança. A sobrevivência é, para ele, uma tarefa tão
espiritualmente árdua, que ele próprio, na condição de sobrevivente, se
pergunta do porque dedicar-se tanto à ela.
Entretanto, a descoberta ao acaso de Regan
representa uma possibilidade de redenção real: Graças aos constantes reparos
feitos em seu aparelho auditivo, ela encontrou uma frequência tão insuportável
para a audição dos monstros que os desabilita, possibilitando matá-los. Algo
antes impraticável.
Apesar de tudo, Emmett reluta muito em dar o
passo seguinte: Procurar pela misteriosa fonte da única transmissão radiofônica
restante –que aparentemente se encontra numa ilha! –para, através dela,
transmitir a frequência que enfraquece os monstros para o mundo todo.
A partir daí o filme, que já era aflitivo e
vertiginoso numa intensidade até maior do que o seu formidável antecessor, se
bifurca em duas linhas narrativas paralelas. Numa delas, talvez a mais
instigante, Regan e Emmett se veem na complicada missão de avançar pelo mar,
num mundo onde tudo representa um perigo, não somente os ruídos que eles mesmo
podem exprimir, mas também as outras pessoas, brutalizadas e selvagens, que
podem encontrar pelo caminho. Na outra, a personagem de Emily Blunt, assim como
o jovem Noah Jupe, tentam se manter ilesos mesmo diante de circunstâncias que
insistem em deixar os monstros sempre à centímetros de trucidá-los.
Se na “Parte 1” o protagonismo era dividido
entre os personagens de Krasinski e Emily Blunt (esposa dele na vida real, vale
lembrar), nesta “Parte 2”, é a ótima Millicent Simmonds quem ganha mais
estatura e relevância, tendo a interessante dinâmica estabelecida entre seus
antagonistas melhor explorada: Ela é, afinal, a pequena heroína que pode ver,
mas não ouvir, enfrentando monstros que podem ouvir, mas não ver.
Extraordinariamente enxuto e despido de tempos
mortos, “Um Lugar Silencioso-Parte 2” é cirúrgico até mesmo em seu desfecho,
quando se encerra subitamente tão logo atinge seu momento-clímax; o que
proporciona uma forte sensação de que uma “Parte 3” é tão vindoura quanto
inevitável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário