sábado, 23 de março de 2024

Amor À Segunda Vista


 Tendo o astro britânico Hugh Grant vindo, alguns anos antes, de realizações como “Quatro Casamentos e Um Funeral” e “Um Lugar Chamado Notting Hill” –hoje certamente clássicos do gênero comédia romântica –e a estrela Sandra Bullock vindo de obras como “Enquanto Você Dormia”, era natural que, em algum momento, eles fossem reunidos num único filme a fim de fazer aquilo que faziam de melhor: Encantar o público em romances inofensivos e adocicados.

Havia certamente um outro motivo por trás disso: Tendo sido todos esses filmes citados produzidos na década de 1990, enquanto que este foi lançado em 2002, já corriam alguns anos que, tanto Sandra quanto Hugh, não protagonizavam um sucesso de bilheteria expressivo –e olha que o gênero comédia romântica nem tinha sofrido um severo desgaste como houve na última década! –dessa forma, a ideia dos produtores, era unir as forças e o carisma junto ao público dos dois astros (uma manobra muito comum no cinema norte-americano) para beneficiar ambos com um novo sucesso de bilheteria. Não foi o que houve –como muitos filmes antes realizados por eles, “Amor À Segunda Vista” passou quase que em brancas nuvens pelos cinemas (também pudera, numa temporada que contou com produções como o primeiro “Homem-Aranha”, de Sam Raimi, “O Senhor dos Anéis-As Duas Torres” e “Harry Potter e A Câmara Secreta”, não haveria de ser uma comédia romântica genérica que iria se destacar...) sendo muito pouco lembrado hoje em dia.

A razão é bem evidente: É bem fácil confundi-lo com inúmeras outras comédias românticas realizadas antes e depois tal é a comodidade com que tudo é nivelado aqui. Sandra vive Lucy Kelson, um ativista nova-iorquina; Hugh, com sua habitual fleuma britânica, irredutível seja no constrangimento, seja na seriedade, vive George Wade, um magnata de família bilionária famosa no setor imobiliário, O contexto em que os personagens existem os separa (e ainda os faz opostos um ao outro), mas as circunstâncias (como rege a cartilha dos romances holllywoodianos) haverão de aproximá-los: Quando Lucy tenta interceder junto à George para que não seja demolido um prédio antigo em Coney Island (que, ainda por cima, serve como centro comunitário), George vê em Lucy algo que falta em seus funcionários usuais –e que lhe cobram o tempo todo em seu escritório: Alguém capaz de lhe chamar a atenção para inúmeros detalhes sociais e humanos que, normalmente, passam completamente batido ao desinteressado George.

Sob a promessa de manter o centro comunitário intacto –um desejo que Lucy herdou dos pais, moradores daquele local –ela começa a trabalhar para ele e, valendo-se dos conhecimentos adquiridos na faculdade de Direito (mas nunca postos em prática profissionalmente e nem financeiramente) Lucy começa a se destacar na empresa a ponto de, em pouco tempo, George se descobrir incapaz de ser um advogado funcional sem ela por perto.

Na inevitável simplificação proporcionada pelo roteiro, essa dependência existencial e prática é, desde os primeiros minutos, uma paixão disfarçada, mas, a despeito da obviedade gritante aos olhos do público, os dois personagens envolvidos levarão todo um filme para descobrir isso –somente quando Lucy dá um ultimato, isto é, quando fica farta de ser a babá de um adulto playboy e pede um aviso prévio de demissão, e com isso, acaba estipulando um prazo de validade para a convivência dos dois, é que os protagonistas começam a se dar conta de seus sentimentos.

É bem provável que o grande motivo para que “Amor À Segunda Vista” tenha sido incapaz de chamar muita atenção para si em sua época –e para que, hoje, continue sendo uma produção sem maiores atrativos –é sua total ausência de um diferencial artístico mais contundente. Sandra Bullock é, como sempre, encantadora, mas já haviam dúzias de filmes exatamente iguais (e por vezes melhores que este) onde ela encantava também; e Hugh Grant já não oferecia qualquer novidade no papel do rapaz inglês tímido, ainda que sedutor e de humor depreciativo. Mesmo a ideia de colocá-los juntos não desperta maiores interesses, visto a pouca química que ambos demonstram.

As carreiras de Sandra e Hugh seguiriam nessa espécie de marasmo por mais alguns filmes –sobretudo a dele, que foi meio que retomada em anos recentes com participações em filmes infanto-juvenis como “Paddington” e “Wonka”; enquanto que Sandra Bullock se reinventaria como atriz e como estrela em produções de maior estatura, revelando nela uma intérprete formidável e destemida.

Hoje, a grande razão para “Amor À Segunda Vista” ser lembrado é, curiosamente, uma ponta não-creditada, não-explicada e completamente aleatória de Donald Trump (!), mostrado numa cena que resume bem o filme: Feita para ser uma graciosa novidade, mas tão insossa que mal lembramos dela.

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