"O quê veio primeiro, a música ou a
infelicidade?"
A frase inicial de "Alta Fidelidade"
pronunciada pelo melancólico protagonista já dá um tom preciso do filme: Um
trabalho afiado, na medida entre o triste e o bem-humorado, onde as angústias
do comportamento -sobretudo o masculino -são avaliadas com minúcias,
propriedade e insuspeito carinho.
A reunião de talentos foi das mais felizes. Diretor
de bons e ocasionalmente aclamados filmes britânicos, Stephen Frears soube
transpor a ação do livro de Nick Hornby (um escritor cuja verve pop e
espirituosa especializou-se na análise graciosa das tristezas e alegrias de sua
geração) para a Chicago -quando originalmente era em Londres. O ator John
Cusack, presente em algumas das mais notáveis comédias românticas dos anos
1980, revela uma atuação objetiva e sensata de um jovem adulto dos anos 1990,
às voltas com as reflexões daqueles que, segundo ele, foram os "piores
foras de sua vida", provocados pelo fora que levou, à pouco, de sua
namorada. Essas divagações são temperadas, ampliadas, acrescidas e
transfiguradas pelo acréscimo das músicas pop que possuem relação com esta ou
aquela emoção suscitada e o filme explora isso magnificamente.
Genial, no seu humor e no
seu drama, esse grupo consegue criar um dos mais embriagadores filmes sobre as
reflexões doloridas e até patéticas do amor, com um cativante protagonista e
sua mania compulsiva de fazer lista, inclusive de músicas. Como compete à uma
comédia romântica que se preze, esta tem um final feliz -e ele é luminoso a
ponto de deixar qualquer um com um sorriso no rosto -mas, há uma cena a mais,
um instante inesperado no fim, onde o personagem de John Cusack vislumbra um
possível momento de tristeza no futuro (eles são, afinal, inevitáveis)e
prepara, veja só, mais uma lista de músicas para quando esse momento chegar. E
o filme acaba deixando o expectador só, reflexivo, e de bem com a vida.
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