Um estudo dos reality show muito, muito antes
da era dos reality show começar, "O Show de Truman" é um feito e
tanto: Um roteiro primoroso, astuto e audaz de Andrew Niccol, versando sobre
ganchos, paradigmas e reflexos de narração que ainda soavam inéditos naqueles
saturados anos 1990; um projeto onde o comediante Jim Carrey abraçou a
oportunidade para mostrar o ator brilhante que é de fato, num personagem
carregado de camadas, através das quais o ator permite vislumbrar o lado a um
só tempo patético, destemido, vulnerável e beligerante do ser humano; e,
sobretudo, uma obra de cinema singular perpetrada pelo sempre talentoso Peter
Weir, que a exemplo de seus magníficos "A Testemunha" e
"Sociedade dos Poetas Mortos" adentra um gênero para distorcê-lo,
transmutá-lo com seu agudo estilo e diferenciação, e dele extrair algo
absolutamente novo.
E é, definitivamente algo novo, que encontramos
aqui, na história de Truman Burbank, um rapaz que, sem saber, é o centro do
programa de TV mais assistido de todo o mundo: o "Truman Show", que é
exibido desde que nasceu –e do qual, ele não tem o menor conhecimento!
Todos ao redor dele, portanto, seus amigos,
conhecidos e familiares, são atores contratados para fingir que fazem parte de
sua vida.
Aos poucos porém, Truman começa a detectar
indícios de que sua realidade é diferente aquela que ele pensa (por meio de
pequenos acidentes técnicos que se sucedem ao longo dos anos, pelos ocasionais erros
de continuidade dos atores a sua volta, e pela determinação de uma jovem vivida
por Natascha McElhone disposta a livra-lo de sua ‘novela-prisão’), e isso tudo pode
levar Truman a tentar algo que foi basicamente educado para não fazer:
Arriscar-se a deixar a vida que conhece para trás a fim de ser dono do próprio
destino, e com isso, defrontar-se com o homem responsável por tudo o que
representa o “Truman Show”, o controlador e paternalista Cristof (o magistral
Ed Harris).
Não são somente o roteiro de Niccol, nem a
direção soberba de Weir as grandes estrelas deste achado cinematográfico:
Também o são as atuações de Jim Carrey e de Ed Harris.
Harris, aliás, é o responsável pelo grande
momento do filme, quando já no desfecho, ao alcançar o que certamente é o
limite final de seu mundo idealizado e construído (e portanto, o início do
assustador mundo real), Truman e Cristof (seu pai, criador e, de certa forma, o
deus de seu mundo; e a encenação cuida para que essa metáfora fique clara e poderosa)
ficam pela primeira –e, provavelmente única vez –em contato um com o outro,
para ambos poderem esclarecer dúvidas (sobretudo Truman) e descobrirem quem
passarão a ser dali em diante.
Um trabalho poderoso, sem
dúvidas, um dos melhores dos anos 1990.
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