sexta-feira, 15 de abril de 2016

O Show de Truman

Um estudo dos reality show muito, muito antes da era dos reality show começar, "O Show de Truman" é um feito e tanto: Um roteiro primoroso, astuto e audaz de Andrew Niccol, versando sobre ganchos, paradigmas e reflexos de narração que ainda soavam inéditos naqueles saturados anos 1990; um projeto onde o comediante Jim Carrey abraçou a oportunidade para mostrar o ator brilhante que é de fato, num personagem carregado de camadas, através das quais o ator permite vislumbrar o lado a um só tempo patético, destemido, vulnerável e beligerante do ser humano; e, sobretudo, uma obra de cinema singular perpetrada pelo sempre talentoso Peter Weir, que a exemplo de seus magníficos "A Testemunha" e "Sociedade dos Poetas Mortos" adentra um gênero para distorcê-lo, transmutá-lo com seu agudo estilo e diferenciação, e dele extrair algo absolutamente novo.
E é, definitivamente algo novo, que encontramos aqui, na história de Truman Burbank, um rapaz que, sem saber, é o centro do programa de TV mais assistido de todo o mundo: o "Truman Show", que é exibido desde que nasceu –e do qual, ele não tem o menor conhecimento!
Todos ao redor dele, portanto, seus amigos, conhecidos e familiares, são atores contratados para fingir que fazem parte de sua vida.
Aos poucos porém, Truman começa a detectar indícios de que sua realidade é diferente aquela que ele pensa (por meio de pequenos acidentes técnicos que se sucedem ao longo dos anos, pelos ocasionais erros de continuidade dos atores a sua volta, e pela determinação de uma jovem vivida por Natascha McElhone disposta a livra-lo de sua ‘novela-prisão’), e isso tudo pode levar Truman a tentar algo que foi basicamente educado para não fazer: Arriscar-se a deixar a vida que conhece para trás a fim de ser dono do próprio destino, e com isso, defrontar-se com o homem responsável por tudo o que representa o “Truman Show”, o controlador e paternalista Cristof (o magistral Ed Harris).
Não são somente o roteiro de Niccol, nem a direção soberba de Weir as grandes estrelas deste achado cinematográfico: Também o são as atuações de Jim Carrey e de Ed Harris.
Harris, aliás, é o responsável pelo grande momento do filme, quando já no desfecho, ao alcançar o que certamente é o limite final de seu mundo idealizado e construído (e portanto, o início do assustador mundo real), Truman e Cristof (seu pai, criador e, de certa forma, o deus de seu mundo; e a encenação cuida para que essa metáfora fique clara e poderosa) ficam pela primeira –e, provavelmente única vez –em contato um com o outro, para ambos poderem esclarecer dúvidas (sobretudo Truman) e descobrirem quem passarão a ser dali em diante.
Um trabalho poderoso, sem dúvidas, um dos melhores dos anos 1990.

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