Um dos grandes trabalhos da carreira de Ang
Lee, pelo qual ele conquistou seu primeiro Oscar de Melhor Diretor (o segundo
viria por “As Aventuras de Pi”), este filme vinha, como era de se imaginar, embalado
num tema controverso: O romance proibido entre dois homens.
O curioso é que o tratamento dado pelo diretor
Lee conduzia a história como qualquer romance, ignorando o gênero dos
protagonistas envolvidos: Uma forma austera e admirável de se abordar uma trama
que poderia involuntariamente resvalar em várias posturas sócio-políticas.
O filme em si agradou público e crítica e a
maior polêmica que o cercou envolvia mais os veículos de mídia que não lhe
davam o devido enaltecimento, e os prêmios que lhe eram negados por um suposto
preconceito (um deles, o Oscar de Melhor Filme).
A narrativa de Lee, que se estenderá pelo filme
ao longo de décadas, começa nos anos 1960, ao apresentar, com minúcia exclusiva
e detalhamento cuidadoso os dois cowboys que serão protagonistas do filme,
Ennis Del Mar e Jack Twist (Heath Ledger e Jake Gyllenhaal, ambos de um
brilhantismo interpretativo à toda prova).
E aí já tem-se a primeira manobra notável de
sua premissa: Os personagens principais deste romance homossexual são também
figuras emblemáticas de um gênero cuja postura e atitude é sempre relacionada à
uma arraigada masculinidade tradicional: O western.
Ennis e Jack empregam-se para trabalhar como
pastores de ovelhas durante uma temporada na montanha de Brokeback, para juntar
dinheiro cada um movido por suas próprias razões.
Durante o longo período em que têm tão somente
a companhia um do outro, os dois homens acostumados e criados num ambiente de
rústica masculinidade apaixonam-se, contra tudo aquilo que lhes foi ensinado. E
o tempo que Ang Lee dispõe para relatar o nascimento dessa ligação afetiva é
uma das muitas escolhas brilhantes que passam despercebidas do expectador: Tão
certeira, centrada e incisiva é sua direção e o tratamento com o qual aborda o
roteiro que corremos o risco de achar que este grande trabalho foi feito com
facilidade.
Ao voltarem da montanha, e de volta cada um
para suas próprias vidas (Jack é peão de rodeio; Ennis, um pobre criador de
gado) eles casam-se e têm filhos, sem jamais se esquecerem. Durante as décadas
que virão, os dois buscarão momentos fugazes juntos na montanha Brokeback,
único lugar onde podem expressar seu amor.
Tudo neste filme tematicamente ousado evita a
panfletagem, ou o escândalo. Sereno, Ang Lee reveste o filme com uma percepção
apurada de que todos os seres têm uma equivalente necessidade em querer ser
feliz, e sobre inúmeros aspectos, esse é o norte para o qual apontam as motivações
de seus personagens e de sua própria história. O preconceito, quando existe, é
registrado como algo irrisório que pouco, no final das contas, importará.
Como em todos os seus magistrais trabalhos, Ang
Lee, aqui, também volta seu olhar para aqueles que mais lhe interessam: Os
personagens cuja inadequação para com as normas vigentes serve de empecilho
para que se tornem aquilo que desejam ser, e em sua grandeza, por vezes, se
resignam à miserável condição do drama humano.
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