Reza a lenda que o roteirista Robert Towne
tinha imaginado (isso ainda nos anos 1970, quando projetos comerciais desse
tipo de envergadura só seriam executados umas duas décadas depois!) uma
trilogia sobre Los Angeles, tendo a trama deste filme como estopim, e seu
protagonista, o melindroso detetive particular Jake Gittles (Jack Nicholson,
gigante) como seu fio condutor. Uma continuação de “Chinatown”, de fato, foi
realizada anos depois, intitulada “A Chave do Enigma” e embora não fosse um
filme ruim, padecia de problemas que este primeiro filme não tem: Sua direção
(a cargo do próprio Nicholson) não igualava o primor de equilíbrio e bom senso
que o mestre Roman Polanski apresenta aqui fazendo parecer fácil, e o roteiro
de Towne não tem a polidez, nem a dosagem sensata de reviravoltas, pistas dúbias
e artifícios rocambolescos que ele soube administrar tão bem aqui.
Em seu favor, pode-se dizer que “A Chave do
Enigma” era um filme que já nasceu sob uma expectativa impossível: A de igualar
o patamar estratosférico que esta desigual junção de talentos foi capaz de
operar neste filme absolutamente brilhante.
Na Los Angeles da década de 1950, o detetive
Gittles recebe assim um caso no qual deve seguir os passos de um marido
suspeito de infidelidade. Quando esse marido surge morto, Gittles descobre,
perplexo, que mesmo a mulher que o contratara (que ele julgava ser a esposa),
não era quem estava afirmando ser. Na investigação para descobrir a verdade,
ele termina se envolvendo com a esposa verdadeira (interpretada por Faye
Dunaway), enquanto descortina uma história de corrupção, incesto e conluios
políticos que pode ameaçar sua vida.
Um dos inúmeros trabalhos
geniais que o diretor polonês Roman Polanski entregou naquele período, este
film noir ligeiramente contemporâneo é, não obstante sua localização de tempo
distinta da época em que esses trabalhos afloraram, o exemplar máximo do gênero.
Ao valer-se de uma percepção europeizada sobre elementos intrínsecos ao
conceito americano, Polanski embala seu filme numa desigual névoa de ambigüidade,
não apenas no que tange à cultura da criminalidade (sua visão sobre os
diferentes tipos de meliantes que surgem na trama –dos quais, um deles, o que
esfaqueia o nariz de Gittles, é interpretado pelo próprio Polanski –é carregada
de humor, frivolidade e um viés dúbio), ou a sua postura diante do próprio gênero
em si (que aqui ganha um sem fim de premissas de repaginação, conjugadas na
forma de inventivas ramificações da trama), mas, sobretudo, ao entregar a
elucidação do grande e acachapante mistério (o qual só não despertou mais
controvérsia por conta do primor e da excelência irrestrita com que tudo foi
executado). O único Oscar que recebeu (de Melhor Roteiro Original) é pouco para
premiar a magnitude deste trabalho.
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