segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Chinatown

Reza a lenda que o roteirista Robert Towne tinha imaginado (isso ainda nos anos 1970, quando projetos comerciais desse tipo de envergadura só seriam executados umas duas décadas depois!) uma trilogia sobre Los Angeles, tendo a trama deste filme como estopim, e seu protagonista, o melindroso detetive particular Jake Gittles (Jack Nicholson, gigante) como seu fio condutor. Uma continuação de “Chinatown”, de fato, foi realizada anos depois, intitulada “A Chave do Enigma” e embora não fosse um filme ruim, padecia de problemas que este primeiro filme não tem: Sua direção (a cargo do próprio Nicholson) não igualava o primor de equilíbrio e bom senso que o mestre Roman Polanski apresenta aqui fazendo parecer fácil, e o roteiro de Towne não tem a polidez, nem a dosagem sensata de reviravoltas, pistas dúbias e artifícios rocambolescos que ele soube administrar tão bem aqui.
Em seu favor, pode-se dizer que “A Chave do Enigma” era um filme que já nasceu sob uma expectativa impossível: A de igualar o patamar estratosférico que esta desigual junção de talentos foi capaz de operar neste filme absolutamente brilhante.
Na Los Angeles da década de 1950, o detetive Gittles recebe assim um caso no qual deve seguir os passos de um marido suspeito de infidelidade. Quando esse marido surge morto, Gittles descobre, perplexo, que mesmo a mulher que o contratara (que ele julgava ser a esposa), não era quem estava afirmando ser. Na investigação para descobrir a verdade, ele termina se envolvendo com a esposa verdadeira (interpretada por Faye Dunaway), enquanto descortina uma história de corrupção, incesto e conluios políticos que pode ameaçar sua vida.
Um dos inúmeros trabalhos geniais que o diretor polonês Roman Polanski entregou naquele período, este film noir ligeiramente contemporâneo é, não obstante sua localização de tempo distinta da época em que esses trabalhos afloraram, o exemplar máximo do gênero. Ao valer-se de uma percepção europeizada sobre elementos intrínsecos ao conceito americano, Polanski embala seu filme numa desigual névoa de ambigüidade, não apenas no que tange à cultura da criminalidade (sua visão sobre os diferentes tipos de meliantes que surgem na trama –dos quais, um deles, o que esfaqueia o nariz de Gittles, é interpretado pelo próprio Polanski –é carregada de humor, frivolidade e um viés dúbio), ou a sua postura diante do próprio gênero em si (que aqui ganha um sem fim de premissas de repaginação, conjugadas na forma de inventivas ramificações da trama), mas, sobretudo, ao entregar a elucidação do grande e acachapante mistério (o qual só não despertou mais controvérsia por conta do primor e da excelência irrestrita com que tudo foi executado). O único Oscar que recebeu (de Melhor Roteiro Original) é pouco para premiar a magnitude deste trabalho.

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