Incompreendido: Essa talvez seja a definição
mais adequada para o novo trabalho do diretor Nicolas Winding Refn que, cada
vez mais confortável no rótulo de autor, fez uma de suas mais desafiadoras
obras para o público.
“Demônio de Neon” começa acompanhando os passos
da misteriosa e intrigante Jesse (Elle Fanning, ostentando um sex-appeal que
ela já sinalizava em seus trabalhos com idade mais tenra como “Uma Lugar
Qualquer” e “Super 8”).
Sem família e sem eira nem beira, Jesse quer
destacar-se como modelo profissional no competitivo ambiente de Los Angeles e,
de fato, sua beleza genuína e incomum não tarda a lhe proporcionar
oportunidades, assim como também atrai a inveja de duas colegas (Bella
Heathcote e Abbey Lee) e interesse da maquiadora Ruby (Jena Malone) que,
combinados, representarão certo perigo para ela.
É um conto aflitivo, frio e visualmente
exuberante este que Winding Refn compôs. Sua câmera e sua paleta de cores parecem
incorporar (ou ao menos sugerir) os aspectos mais horrendos do ser humano, em
curiosa oposição à beleza acachapante e opressora que predomina nas imagens.
Assim sendo, ele inicia sua narrativa atento aos ressentimentos mundanos de
ordem mais íntima facilmente ocultos através das aparências, mas gradualmente
atinge atos inquietantes que aproximam esta obra, de fato, de um filme de
terror (incluindo aí o canibalismo!) –embora ele nunca deixe de ser
incategorizável.
Esse jogo de imagens e antíteses justapostas se
evidencia no começo, quando as duas primeiras cenas de diálogo mais relevantes
se sucedem, ambas, numa justaposição de reflexos de espelhos.
O que se segue a partir daí é uma sucessão de
momentos transcorridos numa dimensão abstrata através da qual o diretor colhe
imagens de absurdo alegórico e composição minimalista e refinada, extraindo
constante estranheza: De aspecto metafórico, sobretudo, parecem ser as cenas
ocorridas no motel onde Jesse se hospeda –um puma surge do nada do apartamento
dela (!!!) –ocasionadas pela presença ameaçadora e invasiva de um gerente pernicioso
e diabólico (Keanu Reeves, surpreendendo num papel sombrio e perigoso).
É verdade que Elle Fanning, talentosa,
carismática e graciosa, sustenta sozinha grande parte do filme, e é verdade
também que esse é um de seus grandes problemas, visto que a guinada radical,
inesperada, macabra e anti-climática que ocorre em seus vinte minutos finais
deixa de lado a protagonista (no que pode, ou não, ser uma referência de
Winding Refn à “O Eclipse”, de Michelangelo Antonioni) para transcorrer em
cenas de tom quase aleatório, até minguar num final estranho e inconcluso.
Se Winding Refn
experimentou, em seus dois projetos anteriores a aclamação (com o magnífico “Drive”)
e a indiferença (com o mediano “Só Os Deuses Perdoam”), com este “Demônio de
Neon” ele descobriu uma incompreensão extrema da parte de público e crítica,
ultrajados com o retrato superficial e rancoroso que ele faz do mundo fashion.
Esses hiperlativos, somados à obra profundamente desigual que este filme é,
fazem dele o mais absoluto cult-movie de sua carreira.
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