segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Um Dia de Fúria


Em “Taxi Driver”, o mestre Martin Scorsese achou que seria dramaticamente contundente explorar a gradual transformação de um homem comum, já abalado por celeumas de seu tempo, num estopim de fúria psicopata que é revelada na antológica sequência final.
Da mesma maneira, o diretor Joel Schumacher partiu de reflexão parecida ao moldar este seu “Um Dia de Fúria”, com um diferencial mais objetivo: Nem tanto interessa a ele as motivações bem pavimentadas que o caminho de seu protagonista em direção ao surto apresenta; ele que mostrar são as consequências  e os desdobramentos do surto em si.
Por isso, o filme já começa com William (Michael Douglas, vibrante) dando um basta de dentro de um carro que não conseguia avançar devido ao engarrafamento; além de tudo o calor escaldante da Califórnia e o suor resultante lhe acirram os nervos –sua imediata ida (a pé mesmo) à uma loja de conveniência próxima só piora ainda mais o quadro. Indignado com uma pouco lisonjeira discussão com o dono do lugar, William inicia ali seu acerto de contas. Em seguida, ele promove um rastro de intolerância reagindo com violência a tudo e a todos que lhe cruzam o caminho, provocando um caos em sua ida para casa.
Aliás, uma ida para a casa que ele presume ser sua já que é onde sua ex-mulher está com sua filha.
Paralela a essa cada vez mais perigosa trajetória (e hoje munida de uma certa ingenuidade), estão as investigações do policial Prendergast (Robert Duvall) que, em seu último dia de trabalho, encara o inusitado caso de um homem que chegou ao cúmulo de sua injúria com o sistema –e é esse personagem quem vai juntar as peças, no decorrer do filme, a fim de esclarecer tudo, inclusive os motivos (mais pontuais do que se pode imaginar) para William querer extravasar sua fúria nos inadvertidos e alienados seres humanos que vê a sua frente.
De recepção popular consideravelmente calorosa –pode até ser definido assim como cult –este trabalho oscila entre cenas muito boas e alguns momentos bastante discutíveis e lamentáveis, todos eles preenchendo uma premissa das mais promissoras que rendeu um filme menos brilhante do que poderia ter sido.
Ainda assim, com a respeitável exceção da bela adaptação cinematográfica de “O Fantasma da Ópera”, este curioso conto sobre as neuroses reprimidas e, por fim, extravasadas do cidadão médio comum da década de 1990 é o melhor filme de toda a carreira do irregular diretor Joel Schumacher que, a bem da verdade, fez muita porcaria.

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