Milos Forman era um expoente do Movimento do
Novo Cinema Tcheco quando teve, neste projeto, a oportunidade de filmar nos EUA
–até porque, em sua Tchecoslováquia natal, as circunstâncias políticas estavam
complicadas (para não dizer perigosas) para artistas de pensamento livre.
Com um co-produção que tinha inclusive o nome
do francês Claude Berry (diretor de “Jean de Florette“ e “A Vingança de
Manon”) envolvido, Formam estreou nos EUA fazendo um retrato de gerações
despido de amarras formais e convencionais, o que pode ser visto como uma
amostra notável e voluntariosa de seu estilo de direção.
“Procura Insaciável” até possui uma trama,
esboçada com gracejo e traquinagem em meio às cenas de atmosfera quase
documental que Formam registra com um apuro incomum de autenticidade; todos os
atores dos jovens aos mais adultos interpretam com surpreendente naturalismo em
frente à câmera.
É uma espécie de audição musical conduzida por
hippies a cena em que o filme parece se iniciar. Paralelamente a essa cena –e
intercalada a ela por toda sorte de artifícios e ideias casuais de edição
–vemos os perplexos e trapalhões pais de uma adolescente descobrindo
tardiamente que a filha deu uma escapadela de casa. A menina, compreendemos por
meio da livre associação, está entre os hippies metidos à cantores.
Em seu pensamento evidentemente liberal –e
amplificado em seu senso crítico pelo período da Nova Hollywood, pelo fantasma
de Jean-Luc Godard (que a direção de Formam parece evocar em diversos momentos)
e por um carinho bastante pessoal pela contracultura –o diretor se mostra
incorrigivelmente contestador no retrato cômico que pinta dos pais.
A primeira cena do pai da garota (Buck Henry,
de “Essa Pequena É Uma Parada” e “Short Cuts-Cenas da Vida”) é uma sessão de
hipnotismo onde ele busca tentar parar de fumar. Ao lado da mãe (Lynn Carlin),
ele é aquele tipo de adulto que costuma não notar o óbvio –dessa dinâmica,
Formam extrai um humor muito peculiar, longe, no entanto, do vergonhoso.
A jovem, Jeannie Tyne (Linnea Heacock), até
reaparece para de novo fugir tão logo as inevitáveis recriminações começam; e
para piorar, seu pai, obtuso e desastrado, aparece completamente bêbado.
O filme de Milos Formam é, pois, uma busca
ocasionada de um humor quase agridoce. Um olhar certamente condescendente com
os jovens alternativos da época, e gracioso para com as tentativas patetas de
seus pais em entender o que se passa –em dado momento, o pai e a mãe de Jeannie
juntam-se a uma ridícula Associação de Pais de Filhos Perdidos, que nada mais
fazem senão reunir-se com pomba e circunstância para avaliar a inutilidade de
seus métodos –numa cena, um advogado aconselha (e põe em prática) os pais a
fumar baseado a fim de compreender a mentalidade de seus filhos, a geração que
o consome. A orientação técnica e didática de um usuário (Vincent Schiavelli, ator de vários filmes de Formam
interpretando com seu próprio nome) é tão cercada de seriedade que se torna
hilária.
“Procura Insaciável” é uma obra de narrativa
quase solta em seus propósitos e realização, um panorama até empático sobre
duas gerações (dos pais e dos filhos) que, cada qual ao seu modo tiveram (ou
não) que assimilar as mais contundentes mudanças comportamentais testemunhadas
no Século XX e um experimento artístico revelador da compreensão de Milos
Forman sobre a mecânica do cinema, não obstante seu resultado enquanto obra de
consumo beirando o inacessível. Depois dele, Formam entregaria uma formidável
sucessão de grandes trabalhos, inclusive os oscarizados “Um Estranho No Ninho”
e “Amadeus”.
Reparem numa brevíssima
ponta de Kathy Bates, muito antes da fama e do Oscar por “Louca Obsessão”, como
uma das cantoras presentes nas audições.
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