Tão espetaculares foram as colaborações entre o
diretor Steven Spielberg e o astro Tom Hanks (“O Resgate do Soldado Ryan”,
“Prenda-Me Se For Capaz”, “Ponte de Espiões” e “The Post-A Guerra Secreta”,
além da minissérie “Band Of Brothers” que produziram juntos) que, em meio à
elas, o descompromissado “O Terminal” parece ter sido realizado por outra
pessoa.
Spielberg deixou um pouco de lado o cinema
adulto que tem predominado em suas obras nas últimas duas décadas para
experimentar um gênero de difícil manejo, cujas complicações de ordem narrativa
não costumam ser levadas em conta por público e crítica: A comédia.
A situação que envolve o personagem de Tom
Hanks, Viktor Navorski, e que define do início ao fim o filme que ele
protagoniza, não deixa de representar uma sutil referência às mazelas geopolíticas
ocasionadas no Leste Europeu –mas, sua abordagem não poderia ser mais breve;
Spielberg, aqui, quer fazer rir e entreter.
Ao chegar ao Aeroporto Internacional John F.
Kennedy, em Nova York, local de trânsito constante e ininterrupto de turistas
vindos do mundo todo, Viktor se depara com uma circunstância insólita: Durante
seu voo, o país ao qual ele pertence, Krakozhia, sofreu um golpe de estado
deixando, portanto, de existir como nação reconhecida aos olhos da ONU.
O que isso significa para Viktor? Que seu
passaporte se tornou assim inválido (ele não pode cruzar os portões do
aeroporto e pisar oficialmente em solo americano), bem como também se tornou
uma espécie de expatriado (sem voos de retorno para Krakozhia, ele também não
pode voltar para casa).
Dessa forma, Viktor não tem escolha a não ser
viver no ambiente do terminal do aeroporto, o único lugar onde sua incomum
situação permite que ele fique.
E o cenário predominante no filme –que quase se
torna um dos seus personagens –é uma façanha da parte dos técnicos de direção
de arte: O terminal é um local diversificado, preenchido de uma pluralidade
demográfica espantosa, de um movimento e uma atmosfera orgânica e viva. É muito
fácil ser iludido e presumir que Spielberg capturou aquelas cenas num terminal
verdadeiro ao invés de ter recriado tudo em estúdio (que foi o que aconteceu).
A magia do cinema só deixa evidente a artificialidade da encenação quando
notamos que Spielberg lança mão de movimentos de câmera sofisticados e
elaborados demais para uma filmagem feita em locação.
Uma crítica comum a “O Terminal” é que
Spielberg já havia chegado num ponto em que era um diretor arrojado demais,
cinematográfico demais, para tão modesta premissa –e esse argumento se reflete,
sobretudo, no fato de que ele não consegue impedir o filme (bem longo) de
extrapolar as duas horas de duração –no entanto, o diretor conduz com autêntica
satisfação essa trama cheia de galhofa sobre um homem jogado numa cilada cujos
tons absurdistas remetem à algumas obras dos anos 1980, seja em sua
ingenuidade, seja em seu non-sense.
Com seu talento sem igual para o humor, Tom
Hanks explora magnificamente as possibilidades cômicas que se constroem, numa
oportunidade rara para divertir o público, tão constantes foram os projetos
dramáticos que ele assumiu nos últimos anos.
E de fato, o protagonista e o ator que o
interpreta respondem pelo que de mais genuíno e eficiente o filme tem: Como é
inerente à camaradagem com a qual Spielberg enxerga seus personagens, Viktor
logo encontra grandes amigos e aliados em meio à fauna de funcionários do
terminal, como Enrique (Diego Luna), que lhe fornece comida desde que obtenha
algumas informações sobre a bela mocinha do guichê de imigração por quem é
enamorado (Zoe Saldana, antes dos sucessos de “Avatar” e “Guardiões da
Galáxia”); e o desaforado zelador indiano Gupta (Kumar Pallana); além de alguns
inimigos, sobretudo, o chefe de segurança do aeroporto (Stanley Tucci) que o vê
como uma pedra no sapato.
Na narrativa que compõe, Spielberg não demora a
enxergar o terminal como um microcosmos do mundo e da vida onde tudo nele
acontece –não chega a ser surpreendente, assim, que por lá Viktor também
encontra o amor nas formas da comissária de bordo vivida por Catherine
Zeta-Jones (que demonstra menos química com Tom Hanks do que se poderia
esperar).
No cômputo geral, “O
Terminal” é um filme agradável e correto, o quê para o que se espera de um
filme dirigido por Spielberg e estrelado por Hanks é quase uma frustração.
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