segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Harry Potter e O Cálice de Fogo

Para o quarto filme de saga, o diretor do ótimo trabalho anterior, Alfonso Cuarón, recusou a oferta para retornar à direção. Foi chamado então o realizador Mike Newell, de “Quatro Casamentos e Um Funeral” –o primeiro inglês, por sinal, a assumir o comando da saga –o quê proporcionou aos filmes da série uma chance do público experimentar as obras que se sucediam acrescidas das sensibilidades particulares de diferentes cineastas. Chris Columbus deu aos dois primeiros um viés envolvente de aventura juvenil; Cuarón agregou ao terceiro valores cinematográficos e artísticos mais sólidos; enquanto que Newell, valendo-se da ampla experiência nos distintos gêneros que trabalhou, contribuiu com o bombástico humor inglês ao que a saga tinha de comédia, e uma refinada depuração entre o drama e o suspense para o que ela tinha de tragédia.
O resultado é que “O Cálice de Fogo” disputa, com qualquer um dos outros títulos, o posto de melhor filme de toda a saga.
No quarto ano na Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts, Harry Potter já não é mais tão perplexo ao mundo mágico que o cerca. Suas inseguranças são agora angústias inerentes a um adolescente quase normal, que tem a peculiaridade de viver num ambiente regido por magia. Toda Hogwarts se encontra, nesse ano, em polvorosa: A escola será sede de um Torneio Tribruxo –onde Hogwarts e duas outras escolas de magia disputarão a almejada Taça dos Campeões.
Tais campeões serão selecionados pelo poderoso Cálice de Fogo cuja magia impede bruxos menores de dezessete anos de participar. Ou seja, Harry, Rony e Hermione –do alto de seus catorze anos –não podem competir. Contudo, no dia em que os competidores são anunciados, junto do nome dos usuais representantes de cada escola –Viktor Krum (Stanislav Ianevski) a representar o Instituto Durmstrang; Fleur Delacour (Clémence Poésy, de “127 Horas”) representando a Academia de Magia Beauxbatons; e Cedrico Diggory (Robert Pattinson, revelado aqui antes da “Saga Crepúsculo”) como representante de Hogwarts –o Cálice de Fogo cospe também o nome de Harry Potter (!).
Ele é aceito como competidor já que, segundo as regras do Torneio Tribruxo, os desígnios do Cálice de Fogo são onipotentes –o que significa que, na qualidade de perdedor certo, Harry terá alunos de magia mais velhos como adversários, em provas perigosas que podem perfeitamente lhe representar perigo mortal.
Ciente de que tem material de sobra para trabalhar –o livro que é aqui adaptado é um dos mais ricos e extensos de toda série –o diretor Mike Newell é admiravelmente criterioso na seleção dos momentos vultuosos e intensos que são aproveitados: Apenas aqueles que levam a história a avançar. O que sobra em “O Cálice de Fogo” é a aventura mais perfeitamente ajustada, até aqui, nas idas e vindas aflitivas de seu protagonista, absolutamente afiada nos meandros que conduzem, sem que fique claro até o instante fatídico, ao acontecimento divisor de águas para com toda a saga –é aqui, em “O Cálice de Fogo” que testemunhamos o retorno tão alardeado de Lorde Voldemort em toda sua ameaça; e ao interpretá-lo, na intensa cena do cemitério, Ralph Fiennes entrega um dos mais hipnóticos vilões dos últimos tempos, numa atuação raivosa e eletrizante que consegue fazer jus a toda preparação para sua chegada feita pelos filmes anteriores.
Por tudo isso, “Harry Potter e O Cálice de Fogo” marca uma contundente transformação na saga: A partir daqui, nada no mundo de Harry Potter será como antes –e trazer como clímax a primeira e verdadeiramente dolorosa morte de um personagem é só uma faceta dessa constatação –isso é inclusive sentido pelos próprios protagonistas na agridoce e reflexiva cena final, um sutil indício de tudo que está por vir nos excelentes filmes vindouros.

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