segunda-feira, 3 de agosto de 2020

Viagem Insólita

Se “Gremlins”, de 1984, foi uma bela entrada do diretor Joe Dante no mundo do cinema hollywoodiano comercial, apadrinhado por Steven Spielberg, então “Viagem Insólita”, seu projeto seguinte, rumava em direção à ambições técnicas muitos maiores (ainda que ironicamente seu tema fosse a redução de tamanho a níveis microscópicos): Desta vez, Dante quis dar sua própria e alucinada visão do clássico “Viagem Fantástica”, de 1966, do qual empresta praticamente todo o conceito –lá, como aqui, há uma experiência de miniaturização que leva uma pequena nave tripulada para dentro do corpo humano. Contudo, se “Viagem Fantástica” almejava seriedade, “Viagem Insólita” se posiciona como entretenimento, a despeito do arrojo mesmerizante (e, portanto, espantosamente realista) dos efeitos visuais utilizados.
A grande diferença entre essas duas obras é, na verdade, o contexto: Toda a comédia e pantomina que definem o cinema brincalhão e ácido de Joe Dante comparecem aqui, orientando sua trama em uma direção que, em determinado ponto, o afasta por completo das comparações com seu classico inspirador.
O sempre excelente (e até hoje ainda sub-aproveitado) Dennis Quaid interpreta Tuck Pendleton, impetuoso tenente da força-aérea escolhido para um projeto muito incomum: Ser miniaturizado à proporções microscópicas e, dentro de uma nave submergível de alta tecnologia, ser injetado no organismo de um coelho.
Entretanto –e aí começam as grandes contribuições de Joe Dante para diferenciar seu filme –durante a experiência, terroristas dispostos a roubar essa nova tecnologia invadem o laboratório, fazendo com que um dos cientistas tente heroicamente fugir com a seringa portando o já miniaturizado Pendleton.
Antes de ser morto, ele acaba injetando Pendleton e a nave no corpo de um indivíduo aleatório, que vem a ser o hipocondríaco Jack (Martin Short), de início, desesperado com os sintomas que a presença de Pendleton em seu corpo vai provocando.
A parafernália técnica de efeitos práticos e efeitos especiais empregados em “Viagem Insólita” para concretizar o interior agigantado do corpo humano é até hoje fascinante: Não à toa “Viagem Insólita” levou o Oscar de Melhores Efeitos Especiais em 1988.
Não obstante esse vultuoso aparato técnico proporcionado pelo produtor Spielberg, é no tratamento cinematográfico que “Viagem Insólita” realmente chama a atenção.
De ritmo frenético e inquieto –o que, em parte, espelha as aptidões cômicas de Martin Short, uma espécie de protagonista velado do filme –o trabalho de Joe Dante vai da comédia (os transtornos trazidos por Pendleton à vida do perplexo Jack) à aventura (logo, a trama se torna uma corrida contra o tempo para Pendleton voltar ao tamanho normal antes que o estoque de ar dentro da nave acabe, asfixiando-o), do romance (Lydia, vivida por Meg Ryan, ex-namorada de Pendleton, termina compondo com ele e Jack uma espécie de triângulo amoroso) à uma trama mirabolante de espionagem (os vilões interessados em obter a tecnologia de miniaturização, interpretados por Kevin McCarthy e Fiona Lewis, não dão sossego aos protagonistas), por meio de um roteiro que nunca se acomoda. Por isso mesmo, “Viagem Insólita” pode exacerbar a paciência de alguns expectadores mais adultos que pode identificar o grande apreço pelo non-sense que Joe Dante ostenta aqui; e que pode ter respondido pelo retorno insatisfatório que ele teve, à época, nas bilheterias. Não importa. Não é à esses expectadores sisudos que Dante dirige seu filme; é à parcela da plateia ávida por diversão e correria, cujo mote de ficção científica está menos a serviço de alguma reflexão profunda e mais no auxílio de uma produção pipoca e escapista nos moldes daquelas em que Spielberg e seus discípulos se especializaram nos anos 1980.

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