Após conquistar o Oscar 2006 de Melhor
Curta-Metragem com “Six Shooter” (que também contava com Brendan Gleeson em seu
elenco), o diretor e roteirista Martin McDonagh arregaçou as mangas e estreou
em longa-metragens neste “In Bruges”, um trabalho fervilhante de humor negro
que, com o tempo, ficou bem claro, era bastante sintomático de seu estilo e de
suas nada usuais inquietações –nele, enxergamos seu fascínio por matadores de
aluguel (foco de “Sete Psicopatas e Um Shi-Tzu”) e uma estranha obsessão por
anões (!) (também é um anão um dos personagens fundamentais de “Três Anúncios Para Um Crime”).
“In Bruges” prova também que, como contador de
histórias, McDonagh se presta a jamais desempenhar numa zona de conforto: Tão
logo concluem um assassinato encomendado, o veterano Ken (Gleeson) e o novato
Ray (Colin Farrel, vencedor do Globo de Ouro de Melhor Ator em Comédia) são
incumbidos de refugiar-se na cidade de Bruges, na Bélgica, por duas semanas e
lá esperar por notícias.
E assim, durante boa parte de sua primeira
metade, o filme de McDonagh se propõe a discorrer sobre o nada (!): Embora
paisagística e de apelo turístico, Bruges é uma cidade bucólica e modorrenta,
despertando reações diferentes nos dois assassinos de aluguel.
Disposto a acatar as ordens de cima, Ken aceita
a incumbência e tenta distrair-se com o roteiro de visitas proposto pelo hotel
onde se hospedam.
Porém, mais jovem e inquieto, Ray não recebe
tão bem assim a designação; Bruges é um lugar onde deveras ele não gostaria de
estar –e um trágico contratempo acarretado durante sua última missão o corrói
de remorso deixando-o ainda mais agitado.
Enquanto aguardam as instruções do que fazer,
Ken e Ray perambulam pelo lugar, trocam ideias e vivenciam experiências
corriqueiras: Ray observa as filmagens de um longa-metragem local, e fica
intrigado pela presença de um anão (Jordan Prentice) no que parece ser uma
espécie de referência à “Inverno de Sangue Em Veneza”.
É ali que ele conhece Chloe (Clémence Poésy, de
“Harry Potter e O Cálice de Fogo”), jovem traficante local com quem acaba se
envolvendo, e que lhe atrai ainda mais confusão, sobretudo, quando o violento
namorado dela (Jérémie Renier, de “O Amante Duplo”) tenta roubá-lo.
O roteiro de McDonagh parece justapor
exatamente isso, essa escalada da violência (do namoradinho de Chloe a coisa
degringola para o próprio chefe deles, vivido por um ameaçador ainda que
engraçado Ralph Fiennes) num ambiente hermético; e a partir desses
desdobramentos, ele não poupa ninguém: A meia hora final submete seus
protagonistas a revezes violentos e sangrentos que orgulhariam Quentin
Tarantino.
Mais que isso, “In Bruges”
se faz notável pelo seu encadeamento notadamente acadêmico, mas atenciosamente
assimétrico e equilibrado: Os eventos que compõem seu desfecho são de uma
harmonia dramática que se equaciona com os acontecimentos presentes em seu
ponto de partida; curioso é o estranho contraste que a violência algo desmesurada
(ainda que homeopática) e a ausência de zelo para com a integridade de seus
personagens acarreta ao público quando o filme nos confronta com seu clímax:
McDonagh promove um misto destemido de drama agridoce e intriga policial
sangrenta, brindado com uma das mais incomuns e convictas interpretações de
Colin Farrel.
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