Thrillers de espionagem são, em geral, uma faca
de dois gumes: Exigem, no mínimo, diretores hábeis e experientes capazes de
administrar com eficiência os expedientes requeridos pela narrativa. No
entanto, com frequência, acabam rendendo produções charmosas e sedutoras que,
em sua condução envolvente, costumam ostentar o melhor do gênero suspense.
Falta pouco para “Inimigo do Estado” atingir
esse objetivo.
Um diretor com experiência, ele tem. O falecido
Tony Scott, afinal, fez de quase tudo: Um dos mais emblemáticos sucessos
comerciais dos anos 1980 (“Top Gun”, cujo astro, Tom Cruise, era a escolha
inicial para este projeto, terminando substituído por Will Smith); um dos mais
formidáveis e originais filmes de vampiros da mesma década (“Fome de Viver”);
uma longa parceria com Denzel Washington (“Maré Vermelha”, “Chamas da Vingança”
e tantos outros) –mas, nunca escapou de ser lembrado mesmo como o irmão mais
novo de Ridley Scott.
Se não chega a ter estatura de obra-prima,
“Inimigo do Estado” prova, ao menos, a capacidade de seu diretor para compor um
belo e envolvente trabalho.
Tomando por base uma das realizações
fundamentais desse sub-gênero –o brilhante “A Conversação”, de Francis Ford
Coppola –o filme de Tony Scott faz dignamente o que poderia se esperar dele:
Contextualiza o conceito da espionagem para os novos e modernosos tempos,
imprime ação vertiginosa em suas cenas e tecnologia de ponta em seu argumento
(não deixando de lado um molho sócio-político para valorizá-lo), e ainda se sai
com uma vistosa participação especial de Gene Hackman, astro daquele filme.
Numa ponta ilustre que não vai além do prólogo,
o grande Jason Robards é um senador prestes a vetar um lei que libera a
vigilância eletrônica, postura que o leva a ser assassinado a mando de Reynolds
(Jon Voight), um figurão da Agência de Segurança Nacional.
O assassinato ocorre em um parque bucólico,
casualmente em frente a uma câmera programada para captar a migração de
pássaros. O dono da câmera (Jason Lee, também ele numa breve ponta) não tarda a
ser perseguido pelos homens de Reynolds e, antes de sua trágica morte, deixa
uma cópia do flagrante em meio aos pertencentes de um conhecido que encontrou
por puro acaso, o advogado Robert Clayton Dean (Will Smith, numa presença tão
cuidadosamente descuidada na trama quanto costumam ser os protagonistas de
ação).
Sem saber o que tem em mãos, Dean tem sua vida
virada de pernas para ar pelos recursos tentaculares da Agência: Eles plantam
escutas em suas roupas e em toda sua casa; o levam a ser demitido da firma em
que trabalha; anulam todos os seus cartões de crédito e fecham o cerco em torno
dele. Tudo para fazê-lo recorrer à quem eles imaginam que possa estar por trás
disso tudo, o ex-agente Brill (Gene Hackman, sempre ótimo), que cai de
para-quedas no meio da trama tanto quanto Dean.
Brill, cujo background lembra, não por acaso, o
personagem do mesmo Gene Hackman em “A Conversação”, já trabalhou com a Agência
no passado, e por isso, tem pleno conhecimento da extensão de seus recursos –e
representa, para Dean, a única alternativa de como transitar por esse novo e
traiçoeiro mundo da espionagem, e nele encontrar um meio de revidar.
Nessa trama recheada de
reviravoltas até bem pontuadas, o diretor Scott se esbalda nas situações que se
constroem às vezes num ritmo mais frenético do que o adequado. Como é comum em
suas obras, o caprichado visual publicitário se revela um empecilho para que
sua premissa seja por inteiro levada a sério, mas ele tem experiência o
suficiente para administrar ação e suspense em quantidades necessárias que o
façam envolvente até o apoteótico final: Um tiroteio orquestrado com sinergia,
sangue e alta voltagem.
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