Em meados da década de 1990, era comum no
sistema hollywoodiano empregar uma mescla de conceitos para se vender um filme
–na verdade, tal prática ainda persiste, nos dias de hoje –por exemplo, a ficção
científica “Vida” (de 2017) era um conceito que unia “Gravidade” e “Alien-O 8º
Passageiro”, ou “Velocidade Máxima” (daquele período) trazia o conceito de
“Duro de Matar” a bordo de um ônibus.
Embora sua notável premissa tenha o respaldo de
ser baseado num surpreendente episódio real (conhecido nos livros de história
como Os Leões de Tsavo), o filme dirigido por Stephen Hopkins (de “O Predador
2”) não deixa de ser, por assim dizer, um conceito: Une o suspense visceral em
torno de uma fera assassina de “Tubarão” com uma ambientação de cinema clássico
e vistoso, nos moldes de “Lawrence da Arábia” ou “Gunga Dim”.
Com efeito, “A Sombra e A Escuridão” também
remete inadvertidamente ao Eco-Horror (onde os animais normalmente se voltavam
contra o homem), um sub-gênero do terror que deixou de ser realizado com o
politicamente correto.
1898. O engenheiro inglês John Patterson (Val
Kilmer) é enviado para a África, continente no qual a Inglaterra, a Alemanha e
a França disputavam uma espécie de corrida na ânsia por colonizar suas regiões
inexploradas. Uma vez lá, a tarefa de Patterson –como bem lembra tão rudemente
seu superior, vivido por Tom Wilkinson –é construir uma ponte que permita aos
ingleses transpor as corredeiras do Rio Tsavo e assim avançar na sua disputa
com os alemães e os franceses.
Contudo, Patterson encontra um obstáculo
inesperado: Dois grandes leões passam a aterrorizar os trabalhadores locais,
demonstrando comportamento absolutamente incomum para leões; atacam seres
humanos (e não presas animais) sistematicamente, aparentando fazê-lo por
esporte e não por fome; invadem os acampamentos ignorando vestígios deixados
para espantá-los; sobem em árvores e exibem força, resistência, ferocidade e
atrevimento fora do normal.
Quando o número de mortos pelos leões atinge o
número de quatro dezenas, essas características desiguais levam as feras
predadoras a ganhar uma aura lendária entre os trabalhadores –são chamados de a
Sombra e a Escuridão –que ameaçam rebelar-se contra Patterson em função do
medo.
Para auxiliá-lo é chamado o mais próximo que se
pode chegar de um especialista numa situação dessas: O caçador irlandês Charles
Remington (Michael Douglas, no único personagem fictício do filme) cujo
instinto e as técnica audazes de caçada podem dar cabo de feras tão
imprevisíveis.
Esteta de reconhecido capricho visual, Stephen
Hopkins não resiste à tentação de referenciar o cinema ostensivo e épico da
Velha Hollywood, que tem em David Lean seu nome maior; na bela fotografia do
especialista Vilmos Zsigmond, no vasto aparato técnico da produção e até mesmo
na atuação rica em teatralidade de Michael Douglas que recria trejeitos de uma
escola mais antiquada de interpretação (o que o destoa de seus pares em cena),
o diretor transforma “A Sombra e A Escuridão” numa obra cheia de charme devido
aos elementos inusitados que agrega.
Pena que nem tudo sejam
flores: O roteiro do prestigiado William Goldman (de “Butch Cassidy”, “Todos Os
Homens do Presidente” e “Chaplin”) não encontrou o escritor em seus melhores
dias e as situações que ele constrói, bem como os diálogos que escreve oscilam
entre o medíocre e o inspirado. Sem falar que há algo de muito errado com um
filme quando percebemos que sua melhor cena é o breve trecho de um sonho (!).
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