quinta-feira, 11 de junho de 2020

Congo

Produtos comerciais de outros tempos padecem de lapsos desiguais de sua época. “Congo”, realizado nos anos 1990, faz parte de uma tentativa do produtor Frank Marshall em lançar-se como diretor de cinema (sendo suas duas experiências anteriores o irregular “Aracnofobia” e o drama “Vivos”), o que não deu muito certo.
É uma concepção curiosa de aventura, um filme hollywoodiano, acéptico e ameno, que possui, talvez involuntariamente, elementos do ciclo canibal italiano (!) –uma expedição à selva, perigos selvagens, ambientações exóticas, clima de perigo –despido, no entanto, de seus aspectos transgressivos, e que respondiam por seu apelo de público. Ou seja, alguém achou que tudo o que sobrasse poderia resultar num sucesso de bilheteria.
Acima de tudo, “Congo” sofre com a direção insuficiente de Frank Marshall que inicia seu filme sem ritmo, sem empolgação e sem qualquer atrativo visual; mesmo seus enquadramentos de câmera são risíveis e desinteressantes, parecendo uma obra feita para a TV.
É dessa forma que vemos uma expedição à África terminando em tragédia.
No começo de tudo, a protagonista Dr. Karen Ross (Laura Linney, de "O Show de Truman") é despachada com outra equipe para rastrear o paradeiro dos desaparecidos –embora o interesseiro financiador do projeto (Joe Don Baker) esteja mais incomodado com o diamante extremamente precioso que eles estavam prestes a achar do que com a vida do próprio filho (e noivo de Karen) que estava na expedição, interpretado à propósito por Bruce Campbell (ator cult de "Evil Dead"), numa participação especial que parece ratificar as influências de filme B na produção.
A equipe reunida em torno de Karen é curiosa: Inclui o biólogo Peter Elliot (Dylan Walsh, de “Secretariat”) e Amy, uma gorila vinda daquela mesma região africana, criada por ele desde filhote e dotada de prodigiosa capacidade humana de comunicação (e que responde por um avançadíssimo repertório de recursos animatrônicos).
O filme de Marshall quase chega a engrenar quando a numerosa equipe chega à selva –numerosa, porém, os personagens que importarão à premissa são mesmo Karen, Peter, Amy e o guia Cap. Kelly (Ernie Hudson, de “Os Caça-Fantasmas”) –eu disse ‘quase chega a engrenar’, porque a noção de ritmo de sua direção nunca chega a ser perfeita, a visão de ‘expedição à África’ que ele impõe com seu designer de produção é irrisória, com o artificialismo de sua ambientação pulsando de todos os lados; chega a ser tremendamente irônico que tantos filmes de baixo orçamento ao longo dos anos 1970 realizados por picaretas como Jess Franco (“White Cannibal Queen”), Ruggero Deodato (“Holocausto Canibal”) e Sergio Martino (“A Montanha dos Canibais”) terminem sendo infinitamente mais espontâneos, excitantes e divertidos que esta obra modorrenta e apagada.
Quando o filme chega ao seu suposto clímax, onde a expedição encontra os macacos monstruosos que deram cabo dos expedicionários anteriores, sabemos exatamente quais personagens viverão e quais morrerão –a surpresa só fica por conta do involuntário teor politicamente incorreto inerente à época onde os gorilas vilanescos são massacrados pelos bondosos protagonistas e suas armas (inclusive de raios laser!) sem qualquer pingo de hesitação.
Sem maiores méritos como entretenimento, e sem alcançar graça o bastante até mesmo para uma comédia involuntária –característica que às vezes garante uma sobrevida à obras equivocadas –“Congo” foi uma pá de cal nas pretensões do produtor Frank Marshall para uma carreira como diretor de cinema (ele só tornou a dirigir um longa-metragem em 2006, com o pueril “Resgate Abaixo de Zero”), hoje contudo, o filme persiste aparecendo aqui e ali em reprises televisivas como uma das tantas e corriqueiras aventuras de ‘sessão da tarde’.

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