quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

Amor Além da Vida


 Muitos achavam que o Oscar 1999 de Melhores Efeitos Visuais tinha dono: O explosivo, extravagante e nada sutil “Armageddon”, de Michael Bay, e suas cenas grandiloquentes de destruição.

Entretanto, numa postura que tem predominado nos últimos anos inclusive, os votantes da Academia preferiram entregar tal prêmio aos esforços de natureza mais intimista e artística da equipe responsável pelo pouco usual filme romântico dirigido pelo holandês Vincent Ward (de “Navigator-Uma Odisséia No Tempo”).

E, de fato, visualmente, “Amor Além da Vida” é um assombro; uma de suas poucas características que não passa do ponto na saturação do público.

O trabalho de Vincent Ward é um filme mais que simplesmente romântico: Ele é intoxicado de um romantismo que evoca um cinema de conotações abstratas e emocionais, difícil de encontrar um público específico já naquele final dos anos 1990 em que foi lançado, que o diga nos dias ainda mais cínicos de hoje! Se isso já seria o bastante para exasperar a experiência para o público, ele ainda conta com Robin Williams, um ator, é sempre bom lembrar, excelente, dramaticamente compenetrado com as tramas com as quais se engajava (vide, “Sociedade dos Poetas Mortos”, talvez, seu melhor trabalho), e festejado na construção de um humor anárquico e ao mesmo tempo inofensivo para as massas. Entretanto, Williams tinha lá seus poréns: Quando o roteiro não era absolutamente redondo e equilibrado, e quando o diretor não era perspicaz o suficiente para saber dosar sua predisposição aos excessos, Williams saía do controle, e o resultado era um histrionismo sem quantia (como em “Patch Adams-O Amor É Contagioso”) ou uma pieguice inacabável (como em “O Homem Bicentenário”). Em “Amor Além da Vida”, o diretor Ward não consegue lidar com o surgimento dessas duas facetas.

Williams é Chris Nielsen e, na parte inicial do filme, somos testemunhas de seu encontro com a artista plástica Annie Collins (Annabella Sciorra, de “O Vício”), com quem ele vem a se casar e viver uma história de amor. Contudo, tal e qual um certo nicho de obras românticas que estranhamente gostam de levar o romantismo a colidir com a finitude da fatalidade e dali extrair a possibilidade de um amor eterno (como “Ghost-Do Outro Lado Da Vida”, no início dos anos 1990 e “Além da Eternidade” em meados dos anos 1980), o filme confronta seu apaixonado casal central com a tragédia: Chris morre num acidente de carro e seu fantasma vai parar numa espécie de além-vida onde, ao invés de incorporar um conhecido cenário com anjos e demônios, somos inseridos, junto do protagonista dentro de uma pintura (!). Chris está, pois, dentro de um dos quadros pintados por Annie. E esse trecho que se segue responde exatamente pelos truques visuais verdadeiramente notáveis pelos quais o filme ficou famoso.

No entanto, se as imagens de “Amor Além da Vida” são brilhantes, o mesmo não se pode afirmar da história que elas entrelaçam. Tão logo é descoberto esse vínculo espiritual entre Chris e Annie, que o leva a habitar, enquanto fantasma, uma das obras de arte que ela concebe, algo ainda mais drástico os separa. Annie morre, ou melhor, suicida-se incapaz de viver tendo perdido seu grande amor.

Ao lado de outras entidades sobrenaturais, o irrequieto Albert (Cuba Gooding Jr.) e o sábio Perseguidor (Max von Sydow), cujas origens, surpreendentes mais tarde são reveladas, Chris vai empreender uma improvável jornada até o inferno –onde almas suicidas são despachadas, dentro do qual Annie se encontra aprisionada, destituída de sua memória. Assim como a representação pictória do Céu, também o retrato visual do Inferno, no filme de Vincent Ward, é primoroso em sua originalidade e caprichoso em seu acabamento: Uma extensão horizontal e espantosa salpicada de cabeças dos condenados a aflorar do chão.

Se as opções estéticas do diretor Ward fascinam por seu ineditismo e seu bom gosto, por outro lado, o roteiro meloso, redundante e raso de Richard Matheson e Ronald Bass, assim como o estrelato de Robin Williams, incontido em seus arroubos de dramaticidade, levam toda a obra a passar do ponto.

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