É de um gesto objetivo tão sucinto e incisivo que
Francis Ford Coppola inicia sua obra que até hoje impressiona: Um ator que
sequer terá muito peso na narrativa por vir inicia um monólogo imerso em
sombras –o fator de real importância ao filme não é aquele que fala, mas o seu
ouvinte: Don Vito Corleone, vivido com um repertório primoroso de maneirismos
estudados por Marlon Brando.
Está aí, no silêncio contemplativo de Don Vito,
a pista de Coppola: Este não é um filme de ação, não é um filme policial, não é
nem mesmo um filme de gangster no sentido do quê a platéia está acostumada
(pelo menos as platéias dos anos 1970, que receberam estarrecidas este
trabalho); “O Poderoso Chefão” é, sim, uma obra composta por sutilezas,
debruçada sobre as guinadas emocionais sofridas por uma família, e assim
tratada por seu realizador –claro que, sendo Coppola um tremendo admirador da
arte de Akira Kurosawa, não falta ao seu trabalho ação, ritmo brilhantemente
calculado e seqüências de violência, mas tudo isso serve ao princípio
primordial da dramaturgia, da história que se dedica a esmiuçar os personagens.
Há Don Vito, a figura patriarcal que representa
uma liderança quase que icônica nos negócios da família, cuja maneira sensata
de conduzir suas ligações com o crime organizado já não encontra tanta
ressonância nas parcerias que surgem nesses novos tempos; o quê leva Don Vito
aos outros dois grandes personagens do filme: Seus filhos, Sonny e Michael.
Sonny (interpretado com som e fúria por James
Caan) é o primogênito. Consciente de ser o herdeiro direto, Sonny tem todos os
pré-requisitos para preencher a sucessão ao pai: É explosivo, truculento,
rígido e implacável, exatamente como os novos tempos pedem.
Michael (na atuação antológica de Al Pacino), o
caçula, é o seu perfeito oposto: Ex-combatente de guerra, Michael não deseja
mais atribulações para sua vida –e nem o pai deseja para ele –tudo, em seu
comportamento, sugere alguém que planeja sossegar para o resto de seus dias.
Mas, a única coisa previsível da vida é que ela
é imprevisível: Como numa ópera de ironia poderosamente dramática, será
Michael, e não Sonny, quem irá galgar os degraus da Família Corleone em direção
ao topo de sua hierarquia.
Nessa trajetória épica desenhada por Coppola,
outros personagens essenciais surgirão: Freddo (John Cazale), o irmão do meio,
passivo e acanhado; Kay Adams (Diane Keaton), a namorada de Michael com
características convulsivas da nova mulher moderna; Connie (Tália Shire, irmã
de Coppola), a filha de Don Vito, vítima de um marido violento –no casamento da
qual o filme se inicia –e, Tom Haggen (Robert Duvall), dedicado filho adotivo
que assume funções secretariais para o pai.
A vida e as atribulações violentas dessa
família mudará drasticamente o destino reservado a todos eles.
Embora seja em si uma obra
incomum e até revisionista, na comparação com tudo o que veio antes e tudo o
que veio depois dele no gênero (incluindo os exemplares que tentaram, em vão, imitá-lo)
este magistral trabalho de Francis Ford Coppola é, até hoje, o representante
quintessencial do "filme-gangster". Obra-prima.
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