segunda-feira, 11 de maio de 2020

Vingança

As cenas iniciais deste misto de drama, suspense e ação não negam ser este um trabalho do mesmo diretor de “Top Gun”, o falecido Tony Scott: Tomadas aéreas habilmente montadas (à cargo de Chris Lebenzon) e fotografadas (à cargo de Jeffrey Kimball) que estranhamente nada dizem a respeito do filme que se segue depois.
Aqui, Scott reuniu-se com um astro emergente do período, Kevin Costner (que tinha acabado de fazer “Sorte No Amor” e “Campo dos Sonhos”) após um resultado mediano dirigindo “Um Tira da Pesada 2”, em 1987. Costner iniciou por aqui seu hábito de interferir também no resultado final atrás das câmeras (em “Vingança”, ele é produtor executivo), o que à medida que seu estrelato foi se consolidando lhe garantiu ainda mais controle sobre seus projetos, chegando inclusive à ele próprio dirigir (e ganhar um Oscar por) “Dança Com Lobos”.
Entretanto, essa é outra história –que, por sinal, segue pela década de 1990 adentro, e vai até as catástrofes que comprometeram a carreira de Costner, “Waterworld” (como astro e produtor) e “O Mensageiro” (como astro e diretor) –voltemos, portanto, à “Vingança”: Costner vive Jay Cochran, piloto da Força Aérea Norte-Americana em vias de se aposentar –daí as sequências que abrem o filme.
Livre para ir aonde quiser e fazer o que quiser, Cochran decide dar uma passada pelo México onde mora um milionário de quem ficou amigo jogando tênis.
Tiburon ‘Tibey’ Mendez (o veterano Anthony Quinn) vive numa mansão que é uma verdadeira fortaleza, cercada de suspeitos seguranças armados –e, embora os indícios de alguma periculosidade estivessem lá desde o começo (numa cena inicial, Tibey, num rompante de fúria, arremessa seu cão dentro da piscina), Cochran não vê problema em aceitar a hospitalidade do amigo.
Tibey é casado com uma mulher muito mais jovem e infinitamente mais atraente do que qualquer outra, Miryea (a maravilhosa Madeleine Stowe). Por conta de tais divergências, o casamento entre os dois tem seus atritos –Miryea se ressente por Tibey não desejar ter filhos –minimizados somente pelo medo genuíno que ela (e todos os outros à sua volta) sentem dele.
À princípio, Miryea imagina que Cochran será um amigo com as mesmas características que os demais amigos de Tibey ostentam: Espalhafatoso, grosseiro, arrogante e sarcástico –características que não só parecem fazer parte da visão estereotipada que o filme tem do povo mexicano, como também definem o comportamento mafioso em geral.
Contudo, Cochran revela-se alguém diferente, sensível e gentil –adjetivos que levam Miryea a se sentir atraída cada vez mais por ele. Essa circunstância –a do romance proibido –embora de importância fundamental à trama, é um dos empecilhos do filme em face da incapacidade atroz do roteiro em construir diálogos sentimentalmente expressivos para consolidar a situação, do fracasso em esboçar motivações válidas aos personagens (mesmo que essa seja uma premissa que já rendeu infindáveis exemplares à serem referenciados), e da química praticamente inexistente entre Costner e Madeleine que, em cena, deixam até vislumbrar um palpável constrangimento um com o outro em alguns momentos.
Mas, ainda que esse seja o calcanhar de Aquiles do filme... vida que segue: Os dois se envolvem, tornando-se amantes quando percebem que não vão resistir à atração mútua que experimentam –e qualquer expectador e coadjuvante consegue notar a confusão que isso vai render, menos o casal central...
Quando Tibey descobre o adultério, o lado ‘gangster mexicano’ que ele não deixava que Miryea nem Cochran notassem –embora, como eu disse, houvessem pistas bem óbvias disso desde o início –cai sobre os dois com a força de um furacão: Cochran é espancado por seus capangas e deixado numa estrada quase morto, sua cabana (onde o flagra ocorreu) é toda queimada, e Miryea, com o rosto dilacerado, é despachada para um prostíbulo, onde a rotina forçada de meretriz servirá de castigo para sua traição.
No entanto, Cochran não morreu. Ele é resgatado de seu estado moribundo por um camponês e, contando com uma ajuda aqui, outra ali, nos meses que se seguem (o viajante tuberculoso que lhe dá carona e dinheiro; os providenciais capangas ‘do bem’ vividos por Miguel Ferrer e um jovem John Leguizano; e até mesmo uma desvairada e sexy cantora interpretada por Sally Kirkland, que infelizmente não aparece o bastante), vai se recuperando e reconstituindo a trilha de indícios que deverá levá-lo ao paradeiro de Miryea.
Consequentemente, essas investigações esbarram em Tibey, e num definitivo acerto de contas entre ele e Cochran.
Dono de uma premissa calcada em estruturas totalmente manjadas –desde o adultério passando pelo arco dramático da vingança e do amigo que vira inimigo –o filme só escapa da mesmice porque Tony Scott lhe dá um tratamento diferenciado no estilo imediatamente identificável que impõe: Iluminação difusa contra as fontes de luz, enquadramentos a lembrar videos publicitários, cenas nada realistas estilo videoclip e muitos tratamentos de fotografia.
Embora isso torne muito do andamento enfadonho, sobretudo, na primeira parte, também confere alguma identidade ao material, sabendo encontrar em suas pontuações de roteiro, as mais relevantes referências cinematográficas possíveis; na primeira metade, as cenas emulam “O Poderoso Chefão” no registro agressivo e icônico que se tenta fazer dos gangsteres mexicanos, já a segunda metade, faz claras alusões ao faroeste mantendo um ritmo cadenciado do início ao fim. Uma pena que a junção dos elementos propostos –drama romântico, visual estilizado, violência extrema, fatalismo –não resulte numa narrativa completamente apetecível.

Nenhum comentário:

Postar um comentário