Existem complicações inerentes ao fato de se tentar realizar uma continuação de um cult-movie: Primeiro, porque muito provavelmente, as razões que o tornaram cult vão além da mera competência técnica e artística, sendo mais uma conjunção de fatores favoráveis e incomuns; segundo, porque muitas vezes, tal produção pertence à um tempo (anos 1980, no caso) e à um contexto que não se pode reproduzir espontaneamente; e terceiro, porque cult-movies costumam ser encontrados por seu público de uma forma que dificilmente acaba se repetindo.
Embora pertinentes, essas questões se tornam
menores diante deste brilhante “Os Fantasmas Ainda Se Divertem”, e tudo isso
graças ao nome de Tim Burton atrás das câmeras –ele, que jamais abriu mão de
seu estilo ao longo de quase quarenta anos de carreira, entendeu que somente
preservando os mesmos elementos que em 1988 fizeram a originalidade palpitante
do divertidíssimo “Os Fantasmas Se Divertem” seria possível conceber uma
continuação digna e sólida.
E –vejam só! –ele de fato conseguiu: O novo “Beetlejuice”
começa mostrando a rotina da personagem de Winona Ryder, Lydia Deetz, que no
filme original era uma adolescente: Agora, atriz e personagem estão na idade madura,
Lydia possui um programa de TV que, de maneira sensacionalista, explora as
capacidades sensitivas que ele descobriu no primeiro filme. Sua filha, Astrid
(Jenna Ortega) tem a mesma idade que Lydia tinha na época do filme anterior, no
entanto, diferente da mãe, ela faz lá seus esforços para se adaptar –o que leva
mãe e filha a terem seus eventuais conflitos, principalmente, porque Astrid não
acredita nos dons sobrenaturais da mãe (se ela pode comunicar-se com os mortos,
conclui a jovem, então por que nunca conseguiu estabelecer contato com o
falecido pai de Astrid?) e disso se ressente. Um acontecimento inesperado acaba
por reunir as três gerações de mulheres da Família Deetz –Astrid, a filha,
Lydia, a mãe, e Delia (Catherine O’Hara) a madrasta de Lydia –na mesma casa do
filme original: Charles, pai de Lydia e marido de Delia, morreu de forma um
tanto caricata num acidente de avião (mostrado em animação stop-motion) e seu funeral se sucede na mesma casa, na cidadezinha
de Winter River, em que os eventos anteriores ocorreram. O roteiro até que
engenhoso de Miles Millar e Alfred Gough consegue assim justificar uma espécie
de ausência do personagem outrora vivido por Jeffrey Jones (de “Curtindo A Vida Adoidado”) sem precisar descartá-lo pela força das circunstâncias (em 2002, ele
foi judicialmente incriminado de pornografia infantil).
Mas, é claro que, uma vez que toda essa trupe
reaparece em Winter River, a estrela principal haveria de dar as caras também:
Beetlejuice, a assombração de aluguel, vivido de maneira impagável por Michael
Keaton, volta mais uma vez para tumultuar a rotina dos Deetz. Ou não... quando
Astrid se mete numa encrenca de proporções literalmente sobrenaturais, Lydia
não tem outra escolha senão chamar aquele que ela tentava evitar à todo o custo
desde que chegaram –ela pede ajuda ao próprio Beetlejuice que, obviamente, tem
lá o seu preço a cobrar: Com uma ex-esposa maligna e sugadora de almas à solta,
Delores (interpretada pela italiana Monica Bellucci, atual namorada de Burton)
responsável inclusive pela morte de Beetlejuice uns seiscentos anos atrás (!),
ele precisa forjar com Lydia o mesmo pacto do primeiro filme, no qual, ao
casar-se com ela, ele poderia voltar ao mundo dos vivos. No encalço de
Beetlejuice, de Delores e de todo esse pessoal, está ainda Wolf Jackson (Willem
Dafoe, hilário) um ator morto, tão convicto do personagem que morreu
interpretando que, mesmo no além, ainda age como um detetive –e é obedecido por
subalternos como se fosse um!
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