quinta-feira, 16 de fevereiro de 2023

Homem-Formiga e A Vespa - Quantumania


 O despachado Scott Lang (Paul Rudd, absoluto no papel) tem o poder de (na maioria das vezes) diminuir e (ocasionalmente) crescer, e ficar gigante. Na proposta peculiar de seus poderes e no temperamento resiliente e bem-humorado para com os revezes caóticos que cercam sua vida e sua família, Scott –ou, mais precisamente, Homem-Formiga –resume à perfeição os tópicos que nortearam o Universo Marvel, seja nos quadrinhos ou no cinema: Um herói imperfeito, muito longe de ser capaz de integrar o Panteão dos Deuses, a espelhar com descontração e espirituosidade, o próprio expectador. No terceiro longa-metragem que ganhou para si, “Homem-Formiga e A Vespa-Quantumania”, Scott já chega de uma jornada tumultuada e particular vinda de outros dois filmes (nos quais foi introduzida a mitologia por trás de seus poderes, no primeiro; e os potenciais desdobramentos a envolver o tal Reino Quântico, no segundo), e finalmente, de todo um esforço narrativo que o atrela ao Universo Marvel Cinematográfico do qual sempre fez parte, continuando, por sua vez, de onde herói parou em sua última aparição, o extraordinariamente marcante “Vingadores-Ultimato”.

Assim, na sua capacidade de crescer e diminuir, Scott é uma alegoria ambulante, falante e saltitante da capacidade muito humana de se desvencilhar dos problemas e dar a volta por cima –e tantos são os tópicos com os quais o bem-intencionado diretor Peyton Reed tem de lidar que ele já deixa, no início do filme, essa analogia completamente explícita ao público, no monólogo inicial do personagem, acompanhado de uma entrevista para a divulgação de um livro que ele mesmo escreveu: Ex-presidiário, ex-ladrão e outrora negligente pai de família, Scott tomou caminhos tortuosos que o fizeram um dos Vingadores e um dos vários heróis responsáveis pelo salvamento do planeta Terra. Agora, a andar pela rua Scott recebe tapinhas nas costas e copos de café gratuitos... ele também teve sua vida amorosa endireitada, graças a inebriante presença de Hope Van Dyne (Evangeline Lilly), convertida na heroína Vespa durante o segundo filme.

A questão de ser pai negligente, contudo, foi um pouco mais difícil de ser superada: Ao perder o contato por cinco anos com a filha Cassie (Kathryn Newton, substituindo a jovem Emma Fuhrmann que viveu a personagem em “Ultimato”), por conta dos acontecimentos dos filmes anteriores, Scott viu a filha saltar de uma criança para uma jovem mulher, e agora procura recuperar o tempo perdido. Mas, Cassie tem muito do pai: Na melhor das intenções, envolve-se em encrencas das quais padece para sair. É assim que, um tanto quanto auxiliada pelo gênio do Dr. Hank Pym (Michael Douglas), ela desenvolve um aparelho de acesso ao Reino Quântico, o universo microscópico referenciado nos filmes anteriores do Homem-Formiga e que, em “Ultimato”, serviu para executar uma audaz viagem no tempo. Isso, entretanto, acende o alarme em Janet Van Dyna (Michelle Pfeiffer), mãe de Hope e esposa de Hank –ela esteve presa, por trinta anos, no Reino Quântico, antes de ser resgatada, e mantêm em segredo as turbulentas peripécias que lá vivenciou. Mal ela tem tempo para alertar os demais personagens disso e são todos eles –Scott, Cassie, Hope, Hank e Janet –sugados para dentro do Reino Quântico, onde todo o restante do filme se passará.

Cumprindo uma promessa que pairava no ar desde “Homem-Formiga e A Vespa”, o filme mostra que havia toda uma civilização, com fauna, flora e tecnologia, dentro do Reino Quântico, e como a maioria esmagadora de filmes comerciais a retratar um outro mundo, “Quantumania” tem por referência-mor o incontornável “Star Wars”, de George Lucas. É impossível não associá-lo em cenas como a da cantina espacial, ou quando o herói e sua filha encontram os rebeldes alienígenas daquele lugar retratados com uma imodesta proliferação de efeitos visuais.

O elemento que, de fato, vem a trazer uma certa relevância à “Quantumania” –relevância essa que, sejamos honestos, ficou faltando na maior parte dos filmes e séries da Fase 4 da Marvel –vem a ser seu antagonista, Kang, o Conquistador, interpretado com presença majestosa, sólida e fascinante por Jonathan Majors. E o roteiro (a cargo de Jeff Loveness) e a direção até que se empenham em sua apresentação: Um ser vindo das intermináveis realidades alternativas do Multiverso, Kang é mostrado inicialmente como alguém amigável, embora seja a sutileza percebida no temor incontido dos personagens coadjuvantes e de Janet que vá acrescentando pouco a pouco algum suspense em sua iminente aparição. A questão é que Kang deve ser o grande vilão a complicar a vida dos Vingadores no próximos filmes –como o foi Thanos (Josh Brolin) na saga anterior –e, para tanto, sua introdução aqui é realizada com cuidado, planejamento e perspicácia: Exilado no Reino Quântico (por quem, ainda não fica exatamente claro), Kang dispõe de tecnologia avançada e inigualável –com a qual foi capaz de conquistar todo aquele mundo paralelo –e só não partiu de lá com seus vastos e ameaçadores recursos porque um detalhe irrisório no núcleo de energia de sua nave o impede de fazê-lo. Detalhe este que os poderes miniaturizadores de Scott são capazes de resolver. A fim de convercer Scott a ajudá-lo, portanto, Kang aprisiona e ameaça a vida de Cassie, obrigando o Homem-Formiga a elaborar um arriscado plano para salvá-la e sair, com todo seu pessoal, do Reino Quântico.

Embora seja redundante afirmar, “Quantumania” entrega a mesma junção frenética, colorida e descontraída de ação vertiginosa, efeitos visuais vastos e comédia rasgada com a qual a Marvel Studios já acostumou seu público. O manejo bem azeitado de seus realizadores e algumas presenças genuinamente inspiradas de seu elenco (sobretudo, os sensacionais Paul Rudd e Jonathan Majors) o elevam num nível acima de produções recentes da Marvel como “Shang Chi e A Lenda dos Dez Anéis”, “Eternos” ou “Thor-Amor & Trovão”, mas ele padece de um tom demasiado infanto-juvenil que muito agrada ao diretor Peyton Reed (e somente a ele...) e seu desfecho pede por um pouco mais de contundência e menos do final feliz a la Disney como nos é tão desconfortavelmente imposto. No saldo final, felizmente, seu acertos acabam contando muito mais que seus erros.

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