domingo, 4 de maio de 2025

Thunderbolts*


 Quando a Marvel Studios lançou a pra lá de bem-sucedida dobradinha, “Vingadores-Guerra Infinita” e “Vingadores-Ultimato”, em 2018 e 2019, não imaginava estar criando uma verdadeiro cilada para si mesma e para suas vindouras produções a serem elaboradas futuramente –ao conceber duas obras que, em si, atingiam ápices cinematográficos antes inimagináveis, a Marvel estabeleceu um patamar altíssimo, padrão para as expectativas que seu público teria em relação à obras que viessem depois.

Embora realmente tenham havido, depois disso, filmes oscilantes em qualidade –e desse fato alimentar uma constante e aborrecida discussão sobre a saturação das adaptações de histórias em quadrinhos junto ao público –a Marvel ainda conseguiu, vez ou outra, entregar algo de qualidade. Afinal, para cada presepada como “Thor-Amor e Trovão”, havia um passatempo satisfatório como “Homem-Aranha Sem Volta Para Casa”, para cada deslize como “Homem-Formiga e A Vespa-Quantumania” ou “As Marvels”, havia um belo trabalho como “Guardiões da Galáxia Vol. 3” ou “Deadpool & Wolverine”.

Bem, em 2025, a Marvel Studios, se não foi capaz de fazer “Capitão América-Admirável Mundo Novo” tão memorável quanto seus pares, ela conseguiu, com este “Thunderbolts*” entregar aos expectadores tudo aquilo que, no geral, sempre deles se espera –uma obra vibrante, com personagens cativantes e envolventes do início ao fim, bem conjugada no manejo de uma trama que oscila, com desenvoltura e descontração, entre a ação, o humor e o drama.

Grupo clandestino e marginalizado de anti-heróis nos quadrinhos da Marvel –mais ou menos que é “O Esquadrão Suicida” na DC Comics –os Thunderbolts são, tal e qual os Vingadores, uma junção de vários personagens, oriundos de diversos filmes e séries que a Marvel Studios foi produzindo ao longo dos anos; com o adendo de que, diferente dos heróicos e nobres protagonistas à toda prova de antes, agora temos aqui personagens ambíguos, sobreviventes no limiar de suas próprias falhas traumáticas, das experiências defeituosas e das trajetórias torpes que a cada um foi imposta. E o diretor Jake Schreier (de "Cidades de Papel") espertamente soube ancorar esses elementos um tanto quanto diferenciais na narrativa absorvente, política e intrigante que conduz com seu filme.

Pode-se partir do princípio que o eixo em torno do qual “Thunderbolts*” gira é Yelena Belova (Florence Pugh, maravilhosa), a ‘Nova Viúva Negra’, introduzida no Universo Marvel em “Viúva Negra”, sendo irmã adotiva de Natasha Romannof, a Viúva Negra ‘original’, e amargurada desde a morte desta em “Ultimato” –Yelena assume, em “Thunderbolts*”, um protagonismo que Natasha jamais teve a chance de ter num filme dos Vingadores. Além dela, seu ‘pai’, Alexei Shostakov (David Harbour), o Guardião Vermelho, surge como o grande alívio cômico do filme, roubando com carisma inabalável, muitas das cenas em que aparece. Operando nas sombras, e agindo com a ambivalência moral que pouquíssimas vezes vimos em Natasha, Yelena vai finalmente deixando para trás o luto pela irmã, enquanto começa, pouco a pouco, a questionar as missões nebulosas designadas a ela por Valentina Allegra de Fontaine (Julia Loius-Dreyfus, perniciosa feito uma cobra!). Executiva de alto nível em Washington, e encarregada da C.I.A., Valentina enfrenta, no Senado, uma tentativa de impeachment capitaneada, entre outros, por Bucky Barnes (Sebastian Stan, cada vez mais sensacional), devido às atividades nada ortodoxas do Serviço de Inteligência durante a sua gestão. Para continuar no jogo do poder e evitar o impeachment, Valentina vale-se de Yelena para ‘queimar arquivos’ referentes às inúmeras experiências ilícitas que andou autorizando para criar toda uma nova geração de superhumanos a fim de substituírem os tão saudosos Vingadores.

É assim que Yelena termina numa base de operações científicas longínqua, encrustrada numa montanha, onde aparentemente deve dar cabo da Fantasma (Hannah John-Kamen), uma operativa com poder de intangibilidade cuja origem foi revelada em “Homem-Formiga e A Vespa”. No entanto, lá Yelena encontra também o Agente Americano, John Walker (Wyatt Russell), o ex-Capitão América mostrado na minissérie “Falcão e O Soldado Invernal”, enviado para neutralizá-la, além da Treinadora (Olga Kurilenko), também vista em “Viúva Negra” –e, após alguns atritos, todos chegam à conclusão de que foram para lá despachados a fim de se matarem, pois, como tudo o mais, eles são indícios vivos das travessura ilegais que Valentina tem autorizado por baixo dos panos, e devem ser, assim, eliminados. Junto deles, há também o misterioso Bob Reynolds (Lewis Pullman, filho do ator Bill Pullman) cuja atitude normal e amedrontada esconde o fato de que foi cobaia numa experiência que pode fazer dele um dos seres mais poderosos do Universo Marvel: O Sentinela.

Adentrar mais na trama de “Thunderbolts*”, que se desdobra para muito além disso, seria revelar spoilers que certamente comprometeriam a diversão –e fica, portanto, aquela orientação básica, usual à todo lançamento de um filme da Marvel Studios, de evitar a internet (e os spoilers) até que se tenha visto o filme!

Adornado de um clima sombrio e fatalista que poucos filmes da Marvel em geral chegaram a adotar –até porque, neste caso, isso reflete bastante as personalidades alquebradas e em constante conflito pessoal dos anti-heróis aqui reunidos –“Thunderbolts*” é dirigido e roteirizado com primordial atenção à essas facetas desiguais de seus personagens, levando em conta cada uma de suas motivações para a composição do arco de história que os fará uma equipe e os colocará, no clímax fabuloso, na improvável condição de heróis –e por mais que Yelena e Bucky possuam um respaldo de protagonismo muito maior na importância final, todos aqui têm seu momento.

É um consenso entre crítica e público que “Thunderbolts*” é um grande acerto da Marvel Studios, resta saber se eles seguirão conseguindo atender as difíceis exigências de seu público nos próximos projetos –e pelo menos um desses projetos ganha aqui um gancho narrativo e tanto na sua empolgante cena pós-créditos!

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