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segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Ataque dos Cães


 Existe um curioso contraste de expectativas na filmografia de Jane Campion desde sua revelação em “Sweetie” (1989) e “Um Anjo Em Minha Mesa” (1990); presume-se que haverá toda uma sensibilidade de natureza feminina em suas realizações e o que encontramos, na maioria das vezes, são retratos áridos e intimistas da aspereza, da agressividade, ainda que a sutileza com que se dá tal execução seja, quase sempre, mérito dela ser mulher.

“Power Of The Dog” –ou “Ataque dos Cães” numa tradução insatisfatória e insuficiente do título original –exemplifica bem essa disfunção: Um faroeste quase contemporâneo (ambientado em 1927) onde não se dispara um único tiro a despeito dos níveis elevados de tensão que ele consegue atingir. Sua atenção está em facetas inerentes aos seus personagens e como tais aspectos são determinantes para seus desfechos. Com efeito, as frases que encerram e que terminam o filme (a primeira, mencionada por um dos personagens; a segunda um versículo bíblico que, inclusive, esclarece seu título) são fundamentais para a compreensão de seu propósito.

Os dois irmãos Burbank tocam seu rancho e sua criação de gado. São eles o irascível e insensível Phil (Benedict Cumberbatch, brilhante) e o comedido George (Jesse Plemons, de “Jungle Cruise”, numa atuação cheia de dignidade). Os irmãos têm personalidades tão opostas quanto complementares, e somente assim, a dinâmica entre eles parece funcionar: George tenta ignorar as truculências de Phil, enquanto Phil faz, na medida do possível, vista-grossa ao fato do irmão agir e ser diferente em tudo e por tudo dele. Caso de uma parada ocasional de sua comitiva numa humilde estalagem onde fazem a refeição –estabelecimento tocado pela viúva Rose (Kirsten Dunst, num corajoso registro dos efeitos da idade e da desilusão sobre sua outrora beleza) com a ajuda do solícito filho Peter (Kodi Smith-McPhee), um garoto retraído de hábitos peculiares. Lá, Phil de pronto implica com Peter, autor das flores de papel que decoram as mesas. A situação exaspera os ânimos da entristecida Rose e, numa tentativa de confortá-la, George se enamora dela.

Quando os dois decidem se casar, automaticamente transferem essa circunstância para o rancho da família: Uma vez lá, Rose –que padece de potenciais problemas de alcoolismo –encontra dificuldade em lidar com a ameaça que o ambiente excessivamente rigoso e masculino exerce sobre as fragilidades de seu filho, e, sobretudo, com a presença nada amistosa, cheia de rancor e crueldade de Phil.

Ele, contudo, esconde celeumas insondáveis: Fala o tempo todo de seu falecido mentor, um certo Bronco Henry –personagem que nunca aparece, mas é essencial à narrativa –e, embora recrimine Peter o tempo todo devido ao seu suposto comportamento afeminado, aos poucos, é o próprio Phil quem dá indícios de suas tendências homossexuais surgidas ainda jovem em sua relação com Bronco Henry. O foco deste trabalho de Jane Campion, diretora hábil na ênfase das arestas inóspitas do amor, é, portanto, a masculinidade tóxica, tornada ainda mas desprezível quando vem adornada pelos elementos da hipocrisia: O protagonista, tão acusatório, persecutório e supostamente másculo de Benedict Cumberbatch ofende, recrimina e agride as pessoas por aparentarem ser aquilo que, no fundo, ele é.

Tal condição, segundo rege a implacável cartilha dramática construída por Campion aqui, o torna alguém perigoso, um cão raivoso: É questão de tempo, percebe Peter, que Phil encontre pretextos para fazer mal à instável Rose, e quando acontecer, talvez seja tarde demais para o sensato George tomar alguma providência. Sendo assim, sem que sequer o expectador se dê conta, engrenagens se movimentam, ao longo da narrativa pausada, episódica e atenta aos mínimos pormenores, para consolidar um plano em movimento do qual só no momento certo (leia-se, nos quinze minutos finais!) teremos a devida consciência.

Intimista ao extremo, na contramão do cinema convencional e cada vez mais barulhento de hoje, “Ataque dos Cães” é uma obra de rara contenção na qual tem-se a impressão que muito pouca coisa, ou quase nenhuma, acontece durante sua nada modesta duração. Ledo engano: Se o registro, em princípio, parece ser o de uma rotina campestre pontuada por tensões humanas e subliminares, em suas profundezas, muitas motivações, informações e reflexões estão em trânsito a fim de construir um premissa carregada de um incomum e inestimável significado.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Os Indicados Ao Oscar 2022


 E temos então os indicados de 2022 ao grande prêmio do cinema. Segue a lista completa:

FILME

Belfast (Focus)

No Ritmo do Coração (Apple)

Não Olhe para Cima (Netflix)

Drive My Car (Janus/Sideshow)

Duna (Warner)

King Richard (Warner)

Licorice Pizza (MGM/United Artists)

O Beco do Pesadelo (Searchlight)

Ataque dos Cães (Netflix)

Amor, Sublime Amor (20th Century)

DIREÇÃO

Kenneth Branagh, Belfast

Ryûsuke Hamaguchi, Drive My Car

Paul Thomas Anderson, Licorice Pizza

Jane Campion, Ataque dos Cães

Steven Spielberg, Amor, Sublime Amor

A Academia de Artes Cinematográficas repete algumas manobras políticas já empregadas no passado, como a adição-surpresa entre os Melhores Filmes de um candidato estrangeiro –embora o japonês “Drive My Car” dificilmente iguale o prestígio do sul-coreano “Parasita” em 2020 –e a incursão de um filme dirigido por uma mulher: E olha que “Ataque dos Cães”, de Jane Campion, um lançamento da Netflix, ainda chega como grande favorito, tornando possível que este seja o primeiro ano na história do Oscar em que duas mulheres (lembra-se de Chloe Zhao, ano passado?) ganham o maior prêmio simultaneamente.

Surpreendem as presenças dos não tão cotados “King Richard” e “O Beco dos Pesadelos” e as ausências dos imensamente cotados “Apresentando Os Ricardos” e “A Crônica Francesa”.

ATOR

Javier Bardem, Apresentando os Ricardos

Benedict Cumberbatch, Ataque dos Cães

Andrew Garfield, tick, tick…Boom!

Will Smith, King Richard

Denzel Washington, A Tragédia de Macbeth

ATRIZ

Jessica Chastain, Os Olhos de Tammy Faye

Olivia Colman, A Filha Perdida

Penélope Cruz, Madres Paralelas

Nicole Kidman, Apresentando os Ricardos

Kristen Stewart, Spencer

Um incógnita considerável entre as atrizes visto que uma das favoritas –Lady Gaga por “Casa Gucci” –ficou de fora (na verdade, o Oscar foi o ÚNICO prêmio no qual ela não ganhou indicação!) e sua maior concorrente, Kristen Stewart, por “Spencer”, não parece, no momento, gozar de muito prestígio junto aos membros; o que deixa caminho livre para as campanhas de Jessica Chastain, Olivia Colman, Penélope Cruz e Nicole Kidman gerarem frutos.

Entre os atores, há um ranço crescente em relação ao improvável favoritismo Will Smith –eu pessoalmente não gostaria que ele ganhasse por este filme. Quem ganharia então? Possivelmente Benedict Cumberbtch ou Andrew Garfield, não obstante a atuação estupenda de Denzel Washington (na 10ª indicação de sua carreira).

ATOR COADJUVANTE

Ciarán Hinds, Belfast

Troy Kotsur, No Ritmo do Coração

Jesse Plemons, Ataque dos Cães

J.K. Simmons, Apresentando os Ricardos

Kodi Smit-McPhee, Ataque dos Cães

As maiores apostas nesta categoria são aparentemente Jesse Plemons e o veterano Ciarán Hinds, contudo, são vantagens tão tênues que podem perfeitamente cederem a uma vitória-surpresa de Kodi Smith-McPhee.

ATRIZ COADJUVANTE

Jessie Buckley, A Filha Perdida

Ariana DeBose, Amor, Sublime Amor

Judi Dench, Belfast

Kirsten Dunst, Ataque dos Cães

Aunjanue Ellis, King Richard

Supostamente a favorita, Ariana DeBose, se ganhar, entrará para a seleta lista de atores/atrizes que ganharam um Oscar interpretando o mesmo personagem –ao lado dos honoráveis Marlon Brando e Robert De Niro (ambos tendo vivido Vito Corleone em “O Poderoso Chefão” e “O PoderosoChefão-Parte II”) e de Heath Ledger e Joaquin Phoenix (os dois premiados por “Batman-OCavaleiro das Trevas” e por "Coringa”) –já que Rita Moreno levou a estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante pelo filme de 1961, entretanto, a supremacia de Ariana aparece inesperadamente ameaçada pelo surgimento da veterana Judi Dench entre as indicadas (ela que sagra-se, assim, como a intérprete de mais idade a constar nessa categoria), embora muitos críticos apontassem que, do elenco de “Belfast”, era Caitriona Balte (de “Ford Vs Ferrari”) quem mais merecesse essa indicação; está parecendo que a Academia entregará o Oscar à Judi Dench pelo conjunto da obra...

ROTEIRO ORIGINAL

Belfast, Kenneth Branagh

Não Olhe para Cima, Adam McKay, David Sirota

King Richard, Zach Baylin

Licorice Pizza, Paul Thomas Anderson

A Pior Pessoa do Mundo, Joachim Trier e Eskil Vogt

ROTEIRO ADAPTADO

No Ritmo do Coração, Siân Heder

Drive My Car, Ryusuke Hamaguchi, Takamasa Oe

Duna, Jon Spaihts, Denis Villeneuve, Eric Roth

A Filha Perdida, Maggie Gyllenhaal

Ataque dos Cães, Jane Campion

Era visto que Adam McKay estaria nesta categoria com seu “Não Olhe Para Cima” –e a pouca cotação de sua obra na categoria principal pode se refletir numa chance real de ter seu roteiro original premiado –ainda que o grande favorito aqui, por razões muito parecidas, seja o elogiado e emocionante “Belfast”. Jane Campion já tem um Oscar de Melhor Roteiro (por “O Piano”) debaixo do braço, apenas o inusitado “Drive My Car” e o surpreendente “A Filha Perdida” a impedem de levar para casa uma segunda estatueta.

FOTOGRAFIA

Duna, Greig Fraser

O Beco do Pesadelo, Dan Laustsen

Ataque dos Cães, Ari Wegner

A Tragédia de Macbeth, Bruno Delbonnel

Amor, Sublime Amor, Janusz Kaminski

MONTAGEM

Não Olhe pra Cima, Hank Corwin

Duna, Joe Walker

King Richard, Pamela Martin

Ataque dos Cães, Peter Sciberras

tick, tick... Boom!, Myron Kerstein, Andrew Weisblum

DIREÇÃO DE ARTE

Duna, Patrice Vermotte, Richard Roberts, Zsuzsanna Sipos

O Beco do Pesadelo, Tamara Deverell, Shane Vieau

Ataque dos Cães, Grant Major, Amber Richards

A Tragédia de Macbeth, Stefan Dechant, Nancy Haigh

Amor, Sublime Amor, Adam Stockhausen, Rena DeAngelo

FIGURINOS

Cruella, Jenny Beavan

Cyrano, Massimo Cantini

Duna, Jacqueline West

O Beco do Pesadelo, Luis Siqueira

Amor, Sublime Amor, Paul Tazewell

MAQUIAGEM

Um Príncipe em Nova York 2

Cruella

Duna

Os Olhos de Tammy Faye

Casa Gucci

TRILHA SONORA

Não Olhe pra Cima, Nicholas Britell

Duna, Hans Zimmer

Encanto, Germaine Franco

Madres Paralelas, Alberto Iglesias

Ataque dos Cães, Jonny Greenwood

Nas categorias técnicas é visível a predominância de “Duna”, 10 indicações –e torço para que ele faça mesmo uma bela campanha, até para compensar a ausência de Denis Villeneuve na categoria de Melhor Direção –ainda que a honraria de filme com maior número de indicações pertença à “Ataque dos Cães”, com 12, “Amor Sublime Amor”, de Steven Spielberg, vem bem atrás com 7.

CANÇÃO

“Down to Joy”, Belfast

“Dos Oruguitas”, Encanto

“Somehow You Do”, Four Good Days

“Be Alive”, King Richard

“No Time to Die”, 007 Sem Tempo para Morrer

SOM

Belfast

Duna

007 - Sem Tempo para Morrer

Ataque dos Cães

Amor, Sublime Amor

EFEITOS VISUAIS

Duna

Free Guy

007 - Sem Tempo para Morrer

Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis

Homem-Aranha: Sem Volta para Casa

ANIMAÇÃO

Encanto (Disney)

Fuga (NEON)

Luca (Disney/Pixar)

A Família Mitchell e a Revolta das Máquinas (Netflix)

Raya e o Último Dragão (Disney)

Críticos mais rabugentos espernearam com a indicação à Efeitos Visuais de “Homem-Aranha Sem Volta Para Casa” –filme cujas cópias de cinema sofreram até reajustes digitais em algumas cenas –todavia é visto, sobretudo, nesta categoria, que a Academia deseja capitalizar com o sucesso de público. Entre as animações a Disney surge soberana com nada menos do que TRÊS fortes favoritos ao prêmio –os outros dois está ali mais para constar mesmo...

Enquanto que, na categoria de Melhor Canção, “007-Sem Tempo Para Morrer”, com a canção-título de Billie Eilish, surge como favorito, tendo os dois últimos filmes do Bond Daniel Craig (“007-Operação Skyfall” e “007 Contra Spectre”, no caso) levado os prêmios de Melhor Canção Original em seus anos, a despeito das ilustres presenças de Van Morrison, pela canção de “Belfast”, e de Diane Warren (em sua 13ª indicação sem jamais ter ganhado!), pela canção de “Four Good Days”.

DOCUMENTÁRIO

Ascension (MTV)

Attica (Showtime)

Fuga (NEON)

Summer of Soul (Searchlight)

Writing With Fire (Music Box)

FILME INTERNACIONAL

A Felicidade das Pequenas Coisas (Butão)

Fuga (Dinamarca)

A Mão de Deus (Itália)

Drive My Car (Japão)

A Pior Pessoa do Mundo (Noruega)

CURTA-METRAGEM LIVE-ACTION

Take and Run

The Dress

Long Goodbye

On My Mind

Please Hold

CURTA-METRAGEM DE ANIMAÇÃO

Affairs

Bestia

Box Ballet

Robin Robin

Windshield

DOCUMENTÁRIO CURTA-METRAGEM

Audible

Lead Me Home

The Queen of Basketball

Three Songs

When We Were Bullies

Os vencedores serão anunciados na cerimônia a ser realizada no domingo, dia 27 de março.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Vencedores do Globo de Ouro 2022


 A cultura do cancelamento chegou às premiações do cinema. Desde que indícios de um desempenho reprovável foram surgindo –suspeitas de assédio por parte de membros da Imprensa Estrangeira; uma insistência em não agregar representatividade, ignorando grandes obras realizadas por integrantes da comunidade negra, aliás, a descoberta de que a própria Imprensa Estrangeira não traz nenhum negro entre seus membros; e até mesmo relatos de suborno para privilegiar esta ou aquela produção –muitos foram os integrantes de Hollywood que declararam abertamente seu descontentamento com o Globo de Ouro. Tamanha foi essa celeuma que a cerimônia deste ano não teve qualquer transmissão pela TV (os canais se recusaram a veiculá-la) e aparentemente não contou com a presença dos astros cinematográficos e televisivos de praxe.

O que muda? Provavelmente a percepção de que os vencedores nas categorias de cinema sinalizam qualquer predileção no restante da temporada. Os efeitos desse puxão de orelha devem ser assimilados neste ano por vir e, com as devidas precauções tomadas, o Globo de Ouro e a Imprensa Estrangeira devem voltar aos trilhos da normalidade, restaurando algo de sua relevância e as transmissões via TV.

Melhor Filme Dramático

“Ataque dos Cães”

Melhor Filme Cômico ou Musical

“Amor Sublime Amor”

 Melhor Ator – Drama

Will Smith por “King Richard”

 Melhor Atriz – Drama

Nicole Kidman por “Being The Ricardos”

 Houve quem torceu o nariz para a vitória de Will Smith como melhor ator dramático; o consolo para esses descontentes é que muito provavelmente esse seja um dos favoritismos que não se cumprirá. O mesmo parece ser o caso de Nicole Kidman, que ganhou como melhor atriz dramática por um filme que tende a se dispersar na lembrança dos críticos em premiações futuras, sobretudo, porque é o que costuma acontecer com filmes assinados por Aaaron Sorkin. A dúvida é se “Ataque dos Cães” tem, de fato, a força que demonstrou ou isso foi apenas ocasional. Da mesma forma, Jane Campion conquistou o troféu de direção (fazendo com que, pela primeira vez na história, duas mulheres vencessem o prêmio consecutivamente!) deixando para trás o trabalho tão enaltecido de Steven Spielberg. “Amor Sublime Amor”, contudo, conquistou o Globo de Ouro de Filme Cômico ou Musical, na mais disputada das categorias –todas essas obras terminam praticamente garantindo suas vagas no Oscar.

Melhor Diretor

Jane Campion por “Ataque dos Cães”

Melhor Roteiro 

Kenneth Brannagh por “Belfast”
Melhor Atriz – Musical ou Comédia

Rachel Zegler por “Amor Sublime Amor”

Melhor Ator – Musical ou Comédia

Andrew Garfield por “Tick, Tick... Boom!”

Melhor Ator Coadjuvante 

Kodi Smit-McPhee por “Ataque dos Cães”

Melhor Atriz Coadjuvante

Ariana DeBose por “Amor Sublime Amor”

Apesar do prestígio com que adentrou a temporada, “Belfast” teve de contentar-se com o prêmio de melhor roteiro –o que não deixa de ser um reconhecimento mesmo assim; suas chances no Oscar permanecem, visto o apreço que a Academia nutre por obras auto-biográficas. Na categoria de melhor atriz de comédia ou musical, Rachel Zegler trouxe mais um troféu para “Amor Sublime Amor” fazendo dobradinha com sua coadjuvante, Ariana DeBose; dentre as duas, a segunda é a que goza de um maior embasamento da crítica. Por fim, Andrew Garfield teve seu belo trabalho reconhecido num ano em que também marcou presença no grande blockbuster da temporada, “Homem-Aranha Sem Volta Para Casa”.

Melhor Animação

“Encanto”

Melhor Filme em Língua Estrangeira

“Drive My Car” (Japão)
A categoria de Melhor Filme Estrangeiro reconheceu um dos filmes mais elogiados dos últimos meses, embora essa postura também não represente uma continuidade nos demais prêmios, o mesmo não pode ser dito sobre a Melhor Animação, na qual entre favoritos confirmados e esnobados, os Estúdios Disney tornaram a prevalecer.

Melhor Canção Original

No Time To Die, de “007-Sem Tempo Para Morrer”

 Melhor Trilha Sonora Original

Hans Zimmer por “Duna”

O único prêmio conferido à “Duna” terminou sendo o de Melhor Trilha Sonora –algo emblemático, visto que o compositor Hans Zimmer é um fã declarado do livro e afirmou ter feito dessa partitura a mais pessoal de sua carreira –entretanto, já é dito e antecipado que suas chances no Oscar (e talvez até em outras premiações) haverão de ser maiores. A melhor canção acabou com o último filme “007”, interpretada por Billie Eilish, no que parece ter se tornado uma tradição nas obras de james Bond estreladas por Daniel Craig, ganhar os prêmios de melhor músicas; algo que, diga-se, até então, nenhum filme de James Bond havia feito!

As próximas semanas trarão o Bafta, os Prêmios dos Sindicatos e, por fim, o Oscar –esses, prêmios que usufruem de mais prestígio (por enquanto...) do que o Globo de Ouro, e então teremos um desenho mais nítido das tendências e dos favoritismos da temporada de prêmios. Vamos aguardar.

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

X-Men Fênix Negra


 “Fênix Negra” é, em vários aspectos, o fim de uma era: É o fim dos X-Men como eles foram conhecidos até aqui no âmbito cinematográfico, ou pelo menos, o fim da reinvenção promovida em 2011 por “X-Men Primeira Classe”. É também, a produção que marca a última realização dos Estúdios Fox em torno desses personagens que até então a produtora possuía –as negociações que levaram a Disney a adquirir todo o espólio intelectual da Fox e terminaram levando os direitos dos mutantes de volta para a Marvel Studios estavam em curso enquanto “X-Men Fênix Negra” se achava em produção.

Como resultado, este trabalho –o trabalho de estréia, como diretor, do roteirista mais prolífico desta franquia, Simon Kinberg –já veio prejudicado por uma expectativa bastante negativa, e pelo demérito de abordar uma mitologia já, digamos, moribunda: Os personagens de qualquer modo sofreriam um novo reboot no novo estúdio, e até mesmo Hugh Jackman, o representante maior dessa fase dos mutantes em seu auge, já havia se despedido de seu personagem, Wolverine, em “Logan”.

O fato do filme desagradar público e crítica foi somente a cereja no topo desse bolo pra lá de indigesto que muitos foram obrigados a engolir. Mas, por trás de todos esses revezes tremendamente desfavoráveis, a pergunta crucial que fica é: O filme, afinal, é ruim de fato?

Para muitos é um despropósito discutir esses méritos, visto que quando chegou aos cinemas, “Fênix Negra”, por todas as razões já citadas, tinha perdido sua relevância. Entretanto, a verdade é que não... o filme de Simon Kinberg não é tão ruim assim, não!

Também passa longe de igualar a qualidade pulsante de “Primeira Classe”, o melhor filme de toda franquia, ou mesmo a maestria sempre austera de “Dias de Um Futuro Esquecido”, que manteve um nível considerável de qualidade, mas certamente evita muitos dos equívocos estapafúrdios presentes em “Apocalypse”, por exemplo.

Na pior das hipóteses, o roteiro (também escrito por Kinberg) trabalha os elementos com absoluta desenvoltura e familiaridade –tão habituado ele está com o material envolvendo os mutantes que seu manejo é algo que ele faz com serenidade.

No prólogo, temos uma bem-feita cena de acidente, onde uma ainda jovem Jean Grey perde os pais durante um uso inadvertido de seus poderes (cena esta que contradiz algumas circunstâncias nas quais essa mesma personagem foi introduzida no filme anterior, “Apocalypse”). Corta para a atualidade –ou os anos 1980 ou 90 na cronologia incerta da série... –quando Jean (agora interpretada pela gatíssima Sophie Turner, de “Game Of Thrones”) é uma das alunas da Escola Charles Xavier Para Jovens Super-Dotados, e integra, ao lado de Mística (Jennifer Lawrence), Ciclope, seu namorado (Tye Sheridan), Mercúrio (Evan Peters), Noturno (Kodi Smith-McPhee), Tempestade (Alexandra Ship) e Fera (Nicholas Hoult), o grupo conhecido como X-Men, uma espécie de equipe composta de mutantes, disponibilizados por Charles Xavier (James McAvoy), durante as mais variadas emergências a fim de preservar uma boa imagem do povo mutante perante as pessoas normais.

Numa ocasião surge, portanto, uma emergência mais complicada que o habitual: Um ônibus espacial sofre uma avaria e fica à deriva no espaço à mercê do que parece ser uma tempestade de energia solar. À bordo de seu avançado avião high-tech, o Pássaro Negro, os X-Men partem para o salvamento, e quando as coisas se complicam de verdade, os poderes de Jean se revelam fundamentais: Ele consegue proteger a todos, mas é assolada pela estranha radiação que dela parece se apoderar.

Jean, no entanto, sobrevive. Mas, ao voltar para a Terra, uma energia perigosa e imprevisível começa a se apoderar de sua vontade, potencializando e amplificando seus poderes (a telepatia dela sobrepuja a do Prof. Xavier) e ressaltando seus sentimentos negativos em relação à rejeição e ao abandono. Com isso, Jean volta-se contra Xavier e os X-Men e, no processo, descobre-se poderosa o bastante para superar a todos .

Ao mesmo tempo, criaturas alienígenas descem à Terra em busca de Jean, ou melhor, em busca do poder que ela absorveu –e que, em todo universo, parece ser a única criatura capaz de suportá-lo. Liderando esses seres estranhos e muito pouco esboçados ao longo do filme está Vuk, que assume com obviedades o papel de vilã da história (e para a qual a normalmente competente Jessica Chastain entrega uma atuação fria, caricata e apática).

No meio desse entrave, Eric, ou melhor Magneto (Michael Fassbender), assume uma posição mais ambígua: Embora tenha superado seu antagonismo com Charles Xavier –cuja relação oscilava em amizade e rivalidade ao longo dos filmes –ele não concorda de todo com sua postura, embora também não tenha intenção de aliar-se à Vuk e suas inclinações genocidas.

Com essa premissa e com seus ricos personagens justapostos, o roteiro de Kinberg faz o que sempre foi feito em toda franquia; explora suas dinâmicas humanas, ao mesmo tempo em que nunca perde o foco de suas habilidades sobrehumanas. E uma de suas notáveis qualidades é não perder-se em meio à tanta diversidade: Muitas são as cenas, sobretudo, em sua segunda metade, onde vários personagens com poderes diversos estão em conflito, e todos são empregados, de modo geral, com intensidade, coerência e coesão. Pode não parecer nada, mas essa é uma falha muito fácil de se cometer ao se orquestrar um filme sobre super-humanos com tantos poderes distintos entre si. E nela, “Fênix Negra” não cai.

Os maiores problemas que afligem o filme de Simon Kinberg são, na verdade, dois: O primeiro, o fato de Kinberg ter tanta inexperiência como diretor; Nas mãos dele, cenas que tinham tudo para serem antológicas, perdem seu potencial por pequenos detalhes irrisórios, e às vezes, por um tratamento involuntariamente displicente. E, meu Deus, que direção de atores péssima! –ele consegue desperdiçar talentos incontestes como os de Lawrence, McAvoy, Fassbender e Chastain!!

O segundo é o evidente fato dele aqui tentar adaptar o mais famoso dentre todos os arcos narrativos dos X-Men nos quadrinhos, a “Saga da Fênix” –já aproveitada, também sem sucesso, no irregular “X-Men O Confronto Final” –listada, por muitos, entre as melhores HQs de todos os tempos. Se, pelo menos, “Fênix Negra” se sai melhor do que “O Confronto Final” no cômputo geral, ele se obriga a abandonar aspectos empregados naquele filme, e constrói uma pálida versão de elementos que nos quadrinhos eram exuberantes e intensos, resultando assistível, ainda que imperfeito.

sexta-feira, 22 de junho de 2018

O Congresso Futurista


Saído da magistral e densa experiência em rotoscopia formulada chamada “Valsa Com Bashir”, o diretor Ari Folman arriscou, em seu segundo projeto, uma obra concebida com a mesma técnica –que consiste em desenhar animação à mão por cima de uma filmagem real.
Apesar disso, tanto “Bashir” quanto este “O Congresso Futurista” são trabalhos essencialmente adultos.
“Bashir” investigava os labirintos lúgubres das memórias em busca da mais atroz das verdades, já “Congresso...” observa, por meio das alegorias surreais da ficção científica, os subterfúgios improváveis da arte e da tecnologia e a facilidade com que esses percalços podem nos roubar a identidade, a segurança e a sanidade.
Do livro de Stanislaw Lem (autor do romance filmado em “Solaris”), que supostamente esta obra adapta, sobrou muito pouco: Tão transfigurado ele foi pelas idéias pertinentes e de intenções mais atuais de Folman que o que resta do delírio literário e futurista sobre o autoritarismo é, quanto muito, a perplexidade que ele evoca em perspectiva da manipulação da vida.
A magnífica Robin Wright interpreta a si mesma num futuro profético e metalingüístico: Com a substituição cada vez maior das produções filmadas em celulóide pelos filmes digitais gerados por computador, a única e última cartada que ela pode dar para manter-se relevante, segundo seu agente (vivido por Harvey Keitel) é cedendo os direitos de sua imagem para que os estúdios escaneiem seu rosto e usem sua eterna aparência jovem nos filmes do futuro para todo o sempre.
Munido de um elenco espetacular de nomes famosos, conquistados sem dúvida graças à repercussão de sua belíssima obra anterior, Ari Folman alterna os dilemas existenciais de Robin Wright em relação ao que foi sua carreira (flertando audaciosamente com a realidade) e às pulsões de vaidade pessoal de todo artista, com uma gradual e delirante queda rumo à animação que ganha espaço na narrativa em seu segundo ato quando o filme avança alguns anos no tempo, e a protagonista vai participar do assim chamado Congresso Futurista e começa, aos poucos, a perder a certeza da realidade –e o filme, a perder um pouco de seu sentido.
É um reflexão pretensamente profunda e tragicamente surreal sobre a difícil conjugação entre as angústias reais e as imaginárias que paira sobre o processo da arte –e é curioso que Folman não utilize o recurso da animação/live-action para ilustrar essa incongruência, mas sim para confundí-la.

quarta-feira, 21 de março de 2018

Deixe-Me Entrar

O diretor Matt Reeves –que até então era conhecido pelo curioso filme de monstro em ‘founf footage’ “Cloverfield” –jamais foi um realizador medíocre (que o diga o magistral “Planeta dos Macacos-A Guerra” que ele lançou em 2017), todavia, ele correu um risco muito grande ao encarar esta refilmagem norte-americana da obra-prima sueca "Deixe Ela Entrar", pela simples razão de que não havia muitas maneiras de se aperfeiçoar (ou mesmo de recriar) o brilho ímpar com o qual Thomas Alfredson compôs sua obra.
Diante dessa constatação, era inevitável que algo se perdesse na comparação daquele trabalho único com esta versão mais anêmica e pasteurizada –o quê fez deste filme um forte argumento dos puristas que defendem a superioridade indiscutível dos originais sobre as refilmagens. Uma bobagem já que obras aclamadas como “Ben-Hur”, “Os Dez Mandamentos” ou “SeteHomens e Um Destino” são refilmagens.
A trama, como era de se esperar, trocou a ambientação sueca pela norte-americana e a narrativa de Reeves pulsa de boas intenções, ainda que elas sempre fiquem à sombra de seus equívocos. A época continua a mesma, meados dos anos 1980, e seu protagonista também: Um solitário e calado menino, aqui chamado Owen (interpretado com autenticidade por Kodi Smit-McPhee, o garotinho de “A Estrada”), vítima do bullying na escola, e da indiferença materna em casa –um dos recursos interessantes que salientam a solidão infantil é o fato de nunca mostrarem o rosto dos adultos, mesmo nas cenas em que estão presentes, fazendo-os surgir assim com uma severidade anônima ainda mais intensa.
Owen conhece certa noite a estranha menina Abby (Chloe Grace Moretz que nem por um decreto se iguala ao primor de Lina Leanderson no original), a nova moradora, ao lado de um senhor que aparenta ser seu pai (o ótimo Richard Jenkins), de um dos apartamentos do gelado condomínio em que moram.
Abby é sozinha, não tem amigos, surge no playground para brincar apenas à noite e, embora faça frio, não demonstra senti-lo, sempre usando vestes finas.
Aos poucos os dois jovens, cada qual mergulhado num tipo específico de exclusão profunda, vão construindo uma terna amizade, abala pela estarrecedora descoberta de que Abby é, na realidade, uma vampira!
A lembrança do filme original é algo que incomoda, e muito, a apreciação das cenas deste filme aqui. Um bom exemplo é a cena inicial, decalcada de “Janela Indiscreta”, de Hitchcock, onde o diretor se esforça para incrementar a abertura do filme sueco com o uso da trilha sonora de Michael Giacchino (normalmente tão hábil e certeiro) que acaba se mostrando intrusiva, contrastando com o primor silencioso das cenas do original.
Outro caso é uma das cenas de ataque da pequena vampira, justamente aquela que, no filme original, vislumbramos um comovente relance de humanidade na personagem, mas que aqui, na falta de compreensão da personagem, é reduzida a um banal ataque vampiresco, mais atenta aos efeitos especiais que inexistem no original.
Claro que Matt Reeves aproveita a produção cheia de recursos que tem, e até mesmo o fato de ser posterior ao filme sueco –e, portanto, copiá-lo quando lhe convém, e incrementá-lo quando lhe é oportuno. Entretanto, não há, simplesmente não há condições, mesmo que com todo o orçamento do mundo, de igualar a genialidade artística presente do grande e memorável momento de “Deixa Ela Entrar”: A clássica cena da piscina.
Reeves tenta mudá-la, enchê-la de cortes rápidos onde antes não havia, e uma iluminação soturna (que atrapalha seu entendimento) e termina resumindo nesta cena a conclusão que vale para todo o seu filme: O mérito de ser bem produzido ele tem, mas a comparação com o grande trabalho original lhe evidencia toda a redundância e a mediocridade.

quinta-feira, 26 de maio de 2016

X-Men Apocalypse

Uma cena emblemática: Os jovens saem de um cinema após uma sessão de “O Retorno de Jedi” –o filme-sensação do ano, então 1983 –e já estão a discorrer sobre sua qualidade.
“O melhor é ‘O Império Contra-Ataca’” comenta a garota chamada Jubileu.
“Tudo começou com o primeiro filme” diz Scott, o Ciclope (Ty Sheridan) “não haveriam continuações se não fosse o primeiro filme!”
Até que Jean Grey (Sophie Turner) faz uma afirmação categórica:
“Vamos, pelo menos, concordar que o último filme é o pior da trilogia!”
Talvez, uma piada interna da produção, talvez, um acaso carregado de sarcasmo, porém o quê a personagem diz se aplica ao filme no qual estão presentes, “X-Men Apocalypse”.
Dizer que ele é o mais fraco da trilogia iniciada em “Primeira Classe” (cuja austeridade e noção de ritmo do diretor Mathew Vaughn, permanecem a fazer dele o melhor dentre todos os filmes da série) e continuada em “Dias de Um Futuro Esquecido”, contudo, não é desmerecê-lo: “Apocalypse” ainda é um divertimento de qualidade, com interessantes predicados, o problema é que Bryan Singer se despiu de muitos elementos que davam equilíbrio ao conceito e tornavam os X-men tão singulares entre a infinidade de super-heróis que começam a abarrotar as salas de cinema.
Passaram-se dez anos desde os acontecimentos do filme anterior (parece ser uma espécie de tradição nessa nova versão dos mutantes que seus filmes se passem com uma década de intervalo entre um e outro, embora seu elenco principal não demonstre nenhum sinal de envelhecimento), e a Escola Para Jovens Superdotados do Prof. Charles Xavier recebe a cada dia novos alunos, como o novato Scott, que descobriu a pouco as rajadas devastadoras que saem sem controle de seus olhos, ou a instável Jean, cujo poder de telepatia e telecinese parece esconder uma ameaça maior dentro dela.
Dos antigos companheiros de Xavier, Raven, ou Mística (Jennifer Lawrence, catalizando parte das atenções da trama), se encontra pelo mundo, ajudando mutantes à sua própria maneira: É assim que ela chega até o jovem Kurt Wagner, ou Noturno (Kodi Smit-McPhee, tão bom quanto sua versão mais velha vista em “X-Men 2”), um teleportador de corpo azul.
Já, Eric, ou Magneto (Michael Fassbender, em uma bela interpretação) após os eventos pregressos, refugiou-se na Polônia onde buscou começar vida nova.
Todas essas trajetórias colidem quando um mutante ancestral, o milenar En Sabah Nur, ou Apocalypse (Oscar Isaac, cuja atuação esmerada não escapa ao tom canhestro desse tipo de personagem bidimensional), desperta no Oriente Médio, trazendo consigo sua determinada ânsia para varrer os humanos da face da terra.
Com uma habilidade que lhe é inerente, Bryan Singer, concebeu esse recomeço da série “X-Men”, antecipando e, por vezes, alterando os eventos da série original, não apenas enfatizando a pertinente questão do preconceito, mas atrelando a trama de cada filme à um evento histórico ocorrido em cada década respectiva; se em “Primeira Classe” havia o sensacional aproveitamento da crise dos mísseis de Cuba, e “Dias de Um Futuro Esquecido” foi hábil em utilizar como cerne narrativo o final da Guerra do Vietnam, a década de 1980, na qual se ambienta “Apocalypse” não possui nenhum acontecimento histórico importante a ser abordado; e esse é só um dos problemas enfrentados pelo filme.
Ao eleger, o onipotente e cartunesco Apocalypse como seu vilão principal, Singer também desproveu seu filme de um de seus mais encantadores trunfos: As motivações e ideologias, tão pertinentes e atuais, que norteiam seus personagens, inclusive seus vilões, o quê valorizava a trama e suscitava uma discussão sempre interessante.
Não há, porém, muito o que comentar sobre Apocalypse em si: Ele é um vilão somente. Quer a destruição, e cabe aos heróis aplacá-lo, o quê reduz o filme de Singer a um mero filme de ação onde os bons combatem os maus, e as áreas cinzas da personalidade dos adversários são deixadas de lado.
Claro que, mesmo no comando das cenas de ação, Singer continua um artesão de admirável apuro e requinte visual, embora seu uso de efeitos visuais (bastante imodesto na comparação com os enxutos filmes anteriores) fique excessivo na parte final, assim como seu exorbitante hábito de dilatar o tempo além da conta nos momentos de suspense (que já havia ficado provado em “Superman-O Retorno” ser um de seus defeitos).

Talvez, o grande problema de “Apocalypse” seja a condição na qual chega aos cinemas (como terceiro e mais simplório de uma trilogia na qual os dois capítulos anteriores, sobretudo o primeiro, foram magistrais), e também o timing com o qual isso se dá (depois de um mediano “Batman Vs Superman” e de um espetacular “Capitão América-Guerra Civil”, quando uma parte do público e boa parte da crítica já começa a falar sobre a defasagem de superheróis nas salas de cinema). 

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

A Estrada

Numa narrativa que parece incorporar muito da visão pós-apocalíptica de Michael Haneke em “Tempos de Lobo” testemunhamos um das mais esmeradas concepções realistas do fim do mundo –ainda que pouco dos motivos que o deflagraram sejam esboçados: Rios amarelados, a natureza em colapso absoluto, as cidades abandonadas, quando não devastadas (!), desolação e desesperança palpáveis no ar como uma névoa densa.
Pai e filho (Viggo Mortensen e Kodi Smith-McPhee, ambos extraordinários) singram os escombros de um mundo pós-apocalíptico no qual poucos indícios restaram de que houve outrora uma civilização.
Eles vasculham as ruínas em busca de qualquer tipo de comida (sempre escassa) e evitam a todo o custo contato com terceiros; as redondezas queimam em incêndios, e tudo foi reduzido a cinzas.
O pai busca manter intacta a índole do filho (para tanto inventou um ingênuo artifício sobre um "fogo" que a eles foi encarregado de zelar), e protegê-lo da ameaça sempre presente de gangues canibais, enquanto tem dolorosas lembranças da esposa –vivida apropriadamente pela bela e etérea Charlize Theron. 
O diretor australiano John Hillcoat conta, munido de impactante e significativo acabamento visual, uma parábola de sobrevivência onde os personagens anônimos de pai e filho buscam preservar um fiapo de humanidade, em meio a um mundo de desolação, canibalismo e tons monocromáticos.
Apoia-se, para isso, na estupenda interpretação de Viggo Mortensen e no igualmente impecável garotinho Kodi Smith-McPhee. Dois atores fora de série.